terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Língua e fala, voz e ouvido

«[…]

Há sons que acalmam e sons que excitam, e uma língua é o infinito espaço que existe entre esses dois pontos. Cada palavra, cada som, provoca uma mudança no mundo. Nenhum som é neutro. A língua falada é, então, uma forma física de tocar no outro.

[…]

Uma canção toca no corpo que a ouve. Uma canção não fica num ponto e o ouvido noutro ponto, afastados entre si, com um intervalo no meio. Não há intervalo, não há espaço vazio entre uma canção e o corpo que a ouve, não há espaço vazio entre a voz na nossa língua e o nosso corpo. Somos tocados pela língua materna, e isto é uma evidência corporal – não intelectual, insistimos. É uma questão de pele.

[…]»

Gonçalo M. Tavares, “Aprende / a não esperar por ti pois não te encontrarás* | DN, 29.Dez.2013

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* Versos de “Elegia”, poema de Sophia de Mello Breyner Andresen.