sábado, 30 de janeiro de 2021

Português de burros | Bem-vindos ao país cristino [7]

Em defesa dos direitos humanos, contra a segregação social, contra o racismo, contra a xenofobia, contra o André Ven... [ups!, Plúvio, não te estiques],  Fernando Santos* a cara e a voz no vídeo lançado hoje — 30 de Janeiro, "Dia Internacional da Não Violência e da Paz nas Escolas" — pela Amnistia Internacional em associação com, entre outros, a Federação Portuguesa de Futebol

Uma das quatro principais televisões portuguesas tem-no passado ao longo do dia com um garrafal e intolerável erro ortográfico em rodapé mantido sem emenda nos penosos 90 segundos que dura e, não menos preocupante, com a BRIGRA [Brigada Rápida de Intervenção Gramatical], paga com os nossos impostos, a fazer de morta. Estão a dormir ou quê?!
Pobre e desamparado país cristino.

Lá pelo meio, Fernando Santos, que, como sabemos, é extremamente devoto, reza: 
Somos todos iguais. Não interessa a cor da pele, a raça, o género, a orientação sexual.
Percebo o sentido mas discordo. Não há duas pessoas iguais. Se me é indiferente a pele, o meu fenótipo, o sexo, o que me atrai, por que haverei de me interessar?
Não interessa, os tomates!, embora pressinta que o Plúvio talvez devesse explicar-se melhor para sair da putativa moldura de troglodita.

discriminação, suas alimárias!

Não desisto de lembrar que o pior em erros destes é a alta probabilidade de crianças por perto.
_______________________________________
* , como quem diz. Cá para mim, é bem capaz de ter vendido.
Fernando Santos, o mais medíocre, mais sortudo e dos mais bem pagos treinadores de futebol [em português, mister] do planeta, até meados de Junho de 2020 auferia um salário de seis mil euros por dia [2.200.000,00 € / ano] suportados pela Federação Portuguesa de Futebol, «pessoa colectiva de direito privado sem fins lucrativos, dotada de utilidade pública desportiva». Desde meados de Junho de 2020, quando renovou contrato até 2024 por montante não revelado, é de presumir que não esteja a ganhar menos.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Francisco e Marisa

Resultados eleitorais presidenciais da pastorinha do bonzo de Coimbra:
Ou seja, perdeu 304.843 votos, 65% da votação obtida em 2016.

Na homilia semanal que assina no Expresso — "Estado da Noção" —, o arcebispo Louçã tece na edição de hoje 70 linhas de considerações acerca dos resultados das presidenciais de domingo passado. Eis as únicas palavras, 10 palavras em 70 linhas de texto(!), dedicadas a Marisa Matias, em cuja campanha se envolveu empenhadamente:
«Marisa, apesar da brilhante última semana* de campanha, perdeu votos.»
Como podem estes zelotas, esta gente, dar-se ao respeito?
___________________________________
* Imagine-se se não fosse brilhante...

Miscelânea caleidoscópica

«Há uma miscelândia de gente que foi caçada por diversos pontos da agenda múltipla e caladeiscópica de Ventura.»

Assim fala um veterano e consagrado jornalista-colunista-escritor português.
Contudo, filho de professora.
Faria não fosse.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Rescaldo dum serão eleitoral

um lustro certo depois deste.

Domingo, 24.Jan.2021 - Eleições presidenciais 

«Agradeço, do coração, a militantes do Volt e a tantos e tantos cidadãos e cidadãs independentes que trabalharam para eu estar hoje aqui. A minha candidatura fez-se, desde a primeira hora, do empenhamento de milhares de socialistashomens e mulheres, mais velhos e jovens, que de norte a sul, da beira às regiões autónomas dos Açores e da Madeira me apoiaram e ajudaram decisivamente a aqui chegar hoje. A todas e todos, eles e elas, o meu fraternal reconhecimento, com especial destaque para os membros do governo, os deputados e deputadas, os autarcas que deram a cara e estiveram ao meu lado.»
Mandariam a congruência linguística e as melhores práticas que tivesse dito «tantas e tantos», «socialistas e socialistos»,  «membras e membros», «as autarcas e os autarcos», «a cara e o focinho».

A glória inoxidável da derrota
«Estou convencido de que Ana Gomes fica 2% à frente de André Ventura quando encerrarmos as votações.»

«O resultado não é o que eu desejava. Não é o que mereciam as pessoas que me acompanharam, que me deram força e que estiveram comigo. Este resultado não é também uma falta de comparência. Hoje como ontem, amanhã como hoje cá estarei para todas as lutas, para ganhar e para perder como fiz sempre e como faz toda a minha gente.»

«A Marisa Matias foi a candidata que fez o discurso claro contra o racismo e a xenofobia. Foi a candidata que fez o discurso claro em nome da igualdade e contra a violência contra as mulheres num país onde tristemente as mulheres são assassinadas quase uma por semana em tantos dos anos*. Essa coragem da Marisa Matias inspira muita gente, inspira-me a mim seguramente e estou-lhe muito grata. As noites eleitorais, umas são melhores, outras são piores, mas há uma coisa que nós sabemos: é a firmeza daquilo em que acreditamos e a justeza daquilo em que acreditamos que abre caminhos para o dia seguinte. E é isso que faz a Marisa, abrir caminhos, fazer pontes** muito para lá de qualquer resultado. A Marisa estava cá antes do dia antes das eleições a fazer a luta dos cuidadores informais, a fazer a luta do Serviço Nacional de Saúde, a fazer a luta pelos direitos de quem trabalha, a fazer a luta pelo bem-estar animal***, a fazer a luta pela igualdade por inteiro sem pôr nenhuma luta em lista de espera. A Marisa é essa força grande pela dignidade e por um país melhor e eu tenho o enorme privilégio de saber que vamos continuar a lutar as duas juntas já amanhã.»
[Olh'o Luís Oriola! Pensava que só trabalhasse para o Estado. Afinal, é geringôncico.]
Aqui chegado, convido o paciente freguês do Chove a deter-se por segundos nestes dois instantâneos da ágape coimbrã do Bloco de Esquerda festejando e agradecendo à pastorinha do bonzo de Coimbra a vantagem heróica de 1,01% sobre os 2,94% obtidos pelo probo calceteiro de Rans em quem repeti o meu voto de 2016. É da minha vista, perdão, é do meu ouvido ou vai por ali  uma desavença insanável entre os intérpretes de língua gestual? Quando uma aponta para cima a outra aponta para baixo, quando o Oriola ergue a mão ela baixa-a... Em que ficamos? Que dizem, afinal, Marisa e Catarina? Não nos baralhem a surdez, porra, entendam-se!  

* Catarina a esticar-se, fervor em manobras. A própria Marisa não vai tão longe:
«[...] A eurodeputada lembrou os números: a cada semana uma mulher é assassinada ou vítima de tentativa de homicídio [...] Um a um, Marisa Matias leu o nome das mulheres assassinadas em Portugal em 2020. Leu 27 nomes [...]»
Ora bem. Nos últimos 17 anos, de 2004 a 2020, foram assassinadas 561 mulheres em Portugal, em contexto familiar violento. Como recomendava o outro, é fazer a conta.
Esta gente não poupa esforços, raiando a manipulação e a mentira, para ajustar os factos ao seu evangelho.
Não precisaria de o dizer: um assassínio que fosse seria demais. 

** E consertar autoclismos? Estou a precisar. 

*** Estava a ver que não, béu-béu, miau.

Minhas adoradas filhas, que tencionavam votar em Marisa Matias — quem sai aos seus... — e à última hora se inclinaram para Ana Gomes, não fosse o «fascista-racista-xenófobo» ficar em 2.º:
- Pai, porque dizes tão mal do Bloco de Esquerda?
Porque o Bloco de Esquerda não presta, filhas. E ai de nós quando prestar ou precisarmos de que preste antes de, como determina a ordem natural das coisas, se extinguir. O BE dá-me ares de confraria religiosa de meninos-bem, arrogante, perigosa e meio tonta.
Senão, vejam:

Quinta-feira, 29.Out.2015
No quadro, citando Eduardo Cabrita, da derrota de António Costa nas legislativas de 04.Out.2015 e da urdidura, por esses dias em curso, do entendimento PS-PCP-BE que Paulo Portas, adaptando metáfora de Vasco Pulido Valente no Público de 31.Ago.2014, crismaria de «geringonça», Mariana Mortágua, a deputada-estrela que deve a BEatificação a Ricardo Salgado, veio à Bobadela para «falar das nossas vidas» pós-PàF e do paraíso celeste [não é redundante, Plúvio?] que se adivinhava.
Fui assistir para tomar o pulso à coisa.  
MM chegou num carro velho conduzido por uma rapariga que se pôs tão perto de mim que me foi impossível não reparar no "wallpaper" da ardósia que ia consultando e manteve aberta durante toda a sessão: o carão intimidante deste teólogo prussiano. Mulher de muita fé, a chofer de Mariana.
MM entrou e disse «Boa noite a todas e a todos» num momento em que ainda só havia uma mulher na audiência. Se o ridículo matasse...
No meio da conversa, um camarada, decerto dos ingénuos e puros que há sempre nestes núcleos locais, sensível ao inchaço populoso do parlamento, interpelou:
- Ó Mariana, o Bloco tem alguma proposta no sentido de reduzir o número de deputados na Assembleia da República, como prevê a Constituição 
Mariana Mortágua ia fuzilando o rapaz com o olhar:
- De todo, não! Há estudos acerca da eficiência dos parlamentos europeus que mostram que... 
Como a entendo, parva é que esta Mortágua não é. À saída troquei com ela um aceno. Tem um sorriso bonito. 
Por mim, fiquei faladoconversado.    

BEm-vinda, BEm-vindo, BEm-vindas, BEm-vindos
Se esta gente, a minha gente de Marisa, um dia mandasse — por enquanto não manda em nada, felizmente; nem uma, uminha, das 3092 freguesias do país se deixa governar por esta gente; **** sim, sei de Salvaterra de Magos —, imagine-se a desgraça nas tesourarias e a perturbação da paz social de todos estes rudes e retrógrados sítios e entidades, a remodelar placas e a reconformar a linguagem para os pôr consonantes com o asseio da "ideologia de género".  
Lembro-me sempre da solução picaresca e ridícula que o PS engendrou — et voilà, «género» — para sossego canónico das Isabéis Moreiras,  Catarinas Marcelinos, Tiagos Barbosas Ribeiros, Elzas Pais, Joões Galambas, Edites Estrelas, Pedros Nunos Santos, Sónias Fertuzinhos,  Pedros Delgados Alves, Marias Antónias de Almeidas Santos, Marias Begonhas e Duartes Cordeiros desta vida, no XXI Congresso, em Junho de 2016: Bem-Vindo por uma porta, Bem-Vinda por outra.


Não desgostei do discurso do presidente
No da eleição, em 24.Jan.2016, Marcelo falou durante 16 minutos. Começou por «Portuguesas e portugueses ...» e foi por aí fora, cedendo sempre ao código ridículo do politicamente correcto. Terminou com palmas e hino nacional.
No da reeleição, em 24.Jan.2021, falou durante 17 minutos. Começou por escorreito «Portugueses ...», cedendo aqui e ali, mas pouco, à novilíngua dos devotos. Esteve sério. Terminou sem aplauso nem hino. Muito bem.
«[...] Portugal que, como escrevia o saudoso Eduardo Lourençoé uma nação piquena que foi maior do que os deuses em geral permitem. Tenho a exacta consciência de que a confiança agora renovada é tudo menos um cheque em branco. [...]»
foi onde borrou a escrita. Mas alguém tem exacta consciência? Como pode ser exacta a coisa menos exacta do mundo? Forte, firme, convicta, enraizada, vá que não vá. Mas exacta? Livrem-nos os deuses de consciências que tais, sem esquecer nunca as consciências tranquilas.
Já o «piquena», nada de muito grave, é da filogénese de Cascais, cercado das tias e dondocas de que nunca se livrará.

A propósito de Cascais, onde Marcelo Rebelo de Sousa mora há séculos, sempre me pareceu palhaçada e afronta grosseira da morigeração cívica que continue recenseado numa vilória minhota aonde se desloca para votar, sob pretexto de ali ter sido autarca [autarca volante e volátil...] e dali serem naturais familiares antigos que muito prezava e quer homenagear. Olha se o exemplo pega... Até eu tenho ancestrais na Etiópia a quem devo muitíssimo.
Li isto no Nascer do Sol, li isto e depois isto no blogue do professor Vital Moreira, mas continuo a achar que faz falta um jornalista de voz grossa, testículos negros ou ovários valentes, que frente às câmaras em horário nobre convoque nos olhos o nosso arlequim
- Senhor presidente, não lhe parece insolência ou insulto aos cidadãos, que fazemos por cumprir as regras, essa farsa de, residindo em Cascais, votar em Celorico de Basto?

A despropósito, mas apetece-me,
«A resposta certa é Marcelo Rebelo de Sousa. [...] O Marcelo é em geral uma boa fonte [...] Eu não estava à espera, no caso de Marcelo Rebelo de Sousa, de uma espécie qualquer de lealdade porque não é o forte dele. Eu costumo dizer que ele é filho de Deus e do Diabo. Deus deu-lhe a inteligência, o Diabo deu-lhe a maldade. [...]»

Coda
De eleição para eleição recorre o mito de que, por falta de limpeza nos cadernos de recenseamento, há mortos que votam. Se calhar há.
___________________________________
**** «[...] Sabemos que temos muito a aprender ainda no trabalho autárquico, e muito a fazer. [...]
Mais eleitos e eleitas em todo o país [...] O Bloco de Esquerda tem acrescidas responsabilidades depois destas eleições autárquicas. [...] Há alguns indicadores dessa crescente responsabilidade. Aproveito para vos dizer — soube mesmo antes de vir para aqui — que o Bloco de Esquerda ganhou uma freguesia em Braga e portanto as responsabilidades do Bloco de Esquerda vão sendo crescentes em mais sítios do país.» - Catarina Martins, 01.Out.2017
Ejaculação precoce, não ganhou freguesia nenhuma. Como digo e redigo, fervor em manobras.

domingo, 24 de janeiro de 2021

Saravá, mestre dos mestres!

Yamandu Costa
Passo Fundo, Rio Grande do Sul, Brasil, 24.Jan.1980

Lisboa, Arroios, Março de 2020

Muito obrigado, senhor Yamandu.
Os deuses o preservem.

sábado, 23 de janeiro de 2021

Voto em V

  • Ana Maria Rosa Martins Gomes [do Partido Socialista]- Demagoga, arrivista, populista, espalha-brasas instalada. Pelas minhas sofisticadas e auditadas contas facturará mil votos por cada minuto em que o seu director de campanha não apareceu diante das câmaras. Nisso foi sábia e prudente, convenhamos. Já com Pedro Silva Pereira, n.º 3 da lista do PS nas eleições de 2019 para o Parlamento Europeu, fora o mesmo. O delfim perpétuo de José Sócrates mal se deixou ver. Esta gente será tudo menos estúpida e percebe bem quando há míldio na vinha. 
  • André Claro Amaral Ventura [do Chega]- Demagogo, oportunista, populista. O menos recomendável, a par de Marisa Matias. Não menos alucinado do que quem o apupa de fascista. Convém algum tento na língua, na história e nos conceitos.
  • João Manuel Peixoto Ferreira [do Partido Comunista Português]- Totalitário. Marxista-Leninista-Estalinista. Arqueologia ideológica.
    JF em Alverca do Ribatejo, 22.Jan.2021: «[...] aquilo que tem reconhecidamente sido uma marca desta campanha, que é a Constituição da República Portuguesa. Conhecer a Constituição é a melhor vacina contra aqueles que querem subverter a Constituição e com ela (sic) subverter o regime democrático. [...] Não pode haver maior consenso do que a lei fundamental do país. [...]»
    Importa ter presente que sendo certo que o PCP votou favoravelmente, em 01.Abr.1976, a 1.ª versão da CRP que apontava Portugal ao radioso e redentor sol do socialismo comunista, nas sete revisões — 1982, 1989, 1992, 1997, 2001, 2004 e 2005 — da sua tão acarinhada e consensual «lei fundamental» o partido de João Ferreira votou contra nas primeiras seis, abstendo-se na de 2005. Enfim, JF, sex-symbol sedutor dos crédulos e das alminhas desmemoriadas, mal informadas ou desprevenidas que não sabem, nem JF lhes diz, que parte substantiva do livrinho/texto com que esgrimiu na campanha não é benquista pelo partido a que pertence. Oportunismo e hipocrisia.   
  • Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa [PSD/CDS]- Tudo e o seu inverso; o arlequim a quem Posaconazol Metenamitoso Latanoprostático presta adulação ditirâmbica. Não sei de pior abono.
  • Marisa Isabel dos Santos Matias [do Bloco de Esquerda]- Marx, Trotsky, 4.ª Internacional, Mao, Enver Hoxha, etc., contra a Europa, contra o Euro, contra a Nato, contra a América, contra Israel, contra a Banca, contra o Privado. Pastorinha do bonzo de Coimbra. A pior candidata, a par de André Ventura. Não menos alucinada do que aqueles que acusa de fascistas. Convém algum tento na língua, na história e nos conceitos. 
  • Tiago Pedro de Sousa Mayan Gonçalves [da Iniciativa Liberal]- Inexistência incorpórea e abstracta de morfologia levemente gaseiforme.
  • Vitorino Francisco da Rocha e Silva [do Reagir, Incluir e Reciclar]- Chamam-lhe cromo, simplório, sem estaleca, sem cultura e línguas para a função. A intelligentsia urbanóide lisboeta arrogante e sobranceira de que, entre tantos, Miguel Pinheiro, director executivo do Observador, demonstrou no acompanhamento jornalístico da campanha ser o expoente, desclassifica-o, ridiculariza-o, despreza-o, ignora-o. Cidadão de segunda? Pergunto-me, por exemplo, que têm os cromos institucionais de Arraiolos, a que podemos juntar a rainha de Inglaterra e o monarca sueco, especialmente de virtuoso ou qualificador que Vitorino Silva não possa ter? Confesso que nada anteciparia de aberrante numa República, a portuguesa, eventualmente chefiada por este decente, simpático e respeitável compatriota*. Para o ajudar na função não faltariam decerto pessoas capazes, sem vergonha para Portugal. Tenho em mente uma que lhe proporcionaria óptima assessoria jurídica ou de relações públicas: Marcelo Rebelo de Sousa; além do mais, com experiência de cinco anuidades no cargo.
É assim que, convicta e inconsequentemente, votarei amanhã, domingo, 24.Jan.2021, no mesmo V e com a mesma esferográfica com que votei em 24.Jan.2016, domingo.   
________________________________________
* Dias atrás, na investidura da nova presidência, Amanda Gorman declamou na tribuna da América o poema, sofrível, "The Hill We Climb" que compôs expressamente para o acto, de que extraio, em tradução de Agostinho Pereira de Miranda no Público, esta passagem: 
 
«[...] Nós, os herdeiros de um país e de um tempo
em que uma pequena rapariga negra descendente de escravos
e criada por uma mãe solteira pode sonhar ser presidente
e logo ver-se a declamar para um. [...]»

De imediato, nunca falha, o fervor em manobras da leitura correcta do tempo e do mundo determinou que o que quer que ali se dissesse, dado o sexo do poeta, a suas circunstâncias biográficas mas, quero crer, sobretudo a cor da pele, haveria de soar por cá a, no mínimo, arrebatador e sublime. E de tal modo soou que até Posaconazol, o próprio, lacrimejou de emoção: Prontus, já chorei a minha lagriminha
Por isso, sonhe Amanda com o que sonhar — ser astronauta, coleccionadora de algas ou campeã universal de xadrez — quem se atreverá a objectar-lhe a mínima implausibilidade? No caso, calhou vir-lhe ao devaneio a possibilidade real, efectiva, facultada por uma democracia igualitária, de um dia ser presidente dos EUA. E porque não? Aplauda-se. Oxalá nenhuma razão espúria a cerceie apesar de ser um bocadinho mais escura do que Obama.
Mas isso é quando sonha uma mulher-negra-descendente-de-escravos-filha-de-mãe-solteira [para santo graal da perfeição antropológica só lhe falta, que eu saiba, ser fufa e mãe em regime de esperma comprado].
Já se for um simples e honrado calceteiro branco de Rans a sonhar, e a insistir no sonho, a discriminação da cidade, como talvez descrevesse Valupi, estala como sal no lume, Ó Tino, és um gajo porreiro e engraçado, está bem que voltaste a arranjar as 7500 assinaturas legais mas enxerga-te, pá, cada macaco no seu galho, presidente da junta de freguesia não é o mesmo que da República, não tens aquela classe, falta-te condição, trapioFaltam-lhe auctoritas e gravitas, explicariam os exegetas do "perfil adequado". 
Fosse Vitorino, por exemplo, muçulmano, preto, paneleiro ou habitante da Cova da Moura e imagino o chinfrim de entusiasmo no eixo culto progressista Lux Frágil-Campo de Ourique, nos tuítes das Câncios desta vida, nas redacções do Público, do Diário de Notícias ou mesmo do Observador, no comentariado televisivo. Nem precisava da bela parábola das pedras ou de ter proferido a mais certeira, engraçada e lúcida afirmação na campanha presidencial dos sete candidatos, a respeito de um deles.
Merece reflexão que em Portugal nenhuma figura pública da cultura, da socialite, da política, do desporto ou do entretenimento surja em seu apoio. Pois se até João Ferreira tem um Toy e um João Malheiro... Para Tino de Rans nunca haverá lágrimas de Posaconazol ou êxtases da mulher do brinco: «Agora vou ter o meu momento de elevação, quero falar da América. [...] E portanto vivi o dia da tomada de posse do presidente Biden com uma grande emoção [...] E claro que volto à poeta Amanda Gorman. Foi um momento..., tem havido poucos momentos de felicidade e daquilo que eu prezo mais que é o poder das palavras, e aquela rapariguinha que tem 22 ou 23 anos a dizer o seu poema com aquela elegância, parecia um pássaro a esvoaçar [...]» - CFA, 21.Jan.2021.
//
Obtive de Alexandre Homem Cristo, criatura de encadernação esmerada e com este aparato académico-profissional, a seguinte apreciação das perspectivas eleitorais de André Ventura, V, diga-se de passagem, em que jamais votaria: 
«[...] Se nós tentássemos extrapolar a percentagem para umas legislativas, estaríamos a cometer um erro porque de facto para obter os 10% numas legislativas [...] serão necessários muitos mais votos do que aqueles que André Ventura potencialmente teria se, por exemplo, obtesse 10% nas próximas eleições.»

Estamos nisto.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Fernanda Câncio em manobras

«[...]
Sobre o desempenho da jornalista Fernanda Câncio, os antigos directores são unânimes: é uma profissional de excepção. Miguel Sousa Tavares, que a dirigiu na "Grande Reportagem", afirma que sempre teve "a melhor impressão de Fernanda como jornalista"
[...]
Miguel Coutinho, director do "Diário de Notícias" entre 2004 e 2005, revela que os trabalhos que fez com a redactora são "intocáveis".
António José Teixeira, director do mesmo jornal entre 2005 e 2007, diz que Fernanda é dedicada ao trabalho. João Morgado Fernandes, membro da mesma direcção e director interino antes da chegada de António José Teixeira, descreve-a como uma jornalista minuciosa, que "fala com 500 pessoas antes de escrever".
[...]
No Twitter, na blogoesfera (onde escreve sem letras maiúsculas), ou no Diário de Notícias, Fernanda Câncio tem-se dedicado a escrever sobre o processo Freeport.
[...]»

Até por alturas de 2012/2013, quando comecei a dar mais atenção, menos preconceituosa, a todas as torneiras de informação em vez de apenas ao jornalismo dito "de referência", tinha boa impressão genérica da veterana jornalista Fernanda Câncio [16.Fev.1964], grande repórter no Diário de Notícias, de Lisboa. Além do mais, FC sempre redigiu bem, tirando o modismo afectado, ridículo, do "tudo em minúsculas" que pratica nas redes.
Hoje em dia, tenho da jornalista Fernanda Câncio a pior impressão possível. Considero-a jornalista de agenda, sectária e tendencialmente desonesta — já o era, porventura mais no tempo de José Sócrates, em que eu, enfeitiçado por entusiasmos político-partidários pueris, andava de olhos meio fechados — e, quem diria?, nem sempre devidamente informada.
Dois apontamentos.
//
A gravata ...
«É uma mania minha, de tantas: aversão não negociável às gravatas.[...] pedaço de seda garrida que passa por certificado de respeitabilidade e masculinidade. [...] naquele nó ridículo, debatendo-se para todo o sempre com as particularidades da combinação entre riscas, bolinhas, cornucópias ou cores lisas com a camisa e “o fato” [...] Encontrei muito pouca gente que assumisse gostar de gravatas; não vislumbrei um único que achasse fantástico “ter de” as usar. [...] Reparem: nada existe no vestuário feminino ocidental que se equipare, em simbolismo e carácter compulsivo, à gravata. E nada, como a gravata, transporta a ideia de “reduto masculino”. Uma mulher vestida de calça, casaco e camisa não está “vestida de homem”; mas acrescente-lhe uma gravata e ei-la travestida. O que é tanto mais estranho quanto a ideia de adereço inútil e de enfeite está muito mais associada ao vestuário feminino e ao universo das mulheres que dos homens, geralmente descritos como seres de elevado sentido prático que não se interessam por futilidades nem sequer se preocupam com a imagem – a não ser, bem entendido, que tenham uma orientação sexual não maioritária. [...] a gravata viria a transformar-se num dogma de “seriedade e masculinidade” [...]»

Kamala Harris, vice-presidente dos Estados Unidos da América empossada ontem, tem uma enteada, Ella Emhoff, filha do marido, Doug Emhoff, e da antiga mulher deste, Kerstin Emhoff. Nasceu em 29.Mai.1999, estuda design. Horas antes da cerimónia da investidura presidencial, Ella Emhoff surgiu nalgumas fotografias na companhia do irmão, Cole, e da mãe, junto ao Lincoln Memorial, em Washington, D.C. Esta, em particular, pôs a fricalhada em êxtase e suscitou a Fernanda Câncio o seguinte comentário no Twitter, destaque meu:
«uau. só acho a carteira hedionda ali mas se calhar não tinha nada apropriado. adoro a gravata» 

//
... e a religião
Correm nas redes religiosas de esquerda falsos pronunciamentos, ilustrados, dos mais altos dignitários do corpo eclesiástico português, como José Tolentino Mendonça, Manuel Clemente ou António Marto, prevenindo fiéis e cidadãos incautos contra o que a pandilha e a retórica de André Ventura representam de ofensa e desvio do "verdadeiro" cristianismo e da doutrina social da Igreja. Até pode ser que representem. Sucede que nenhum dos ilustres prelados disse o que quer que fosse daquilo que os crédulos de Marisa Matias, Ana Gomes e afins, incluindo naturalmente Mamadou Ba e Fernanda Câncio, espalham que eles disseram. Leia-se o desmentido da Conferência Episcopal Portuguesa. Daí não me surpreender que MB e FC, falsários como nunca, se agarrem e invoquem contra André Ventura, demónio que os atormenta, o testemunho apócrifo do bispo de Leiria.

Por fim, André Ventura em campanha eleitoral passou na terça-feira, 19, por Coimbra onde, com a trupe chegada, representou a sua pantomima: entrou na Igreja de Santa Cruz pela missa das 17h30 adentro, rezou, comungou, prostrou-se perante o Fundador e cá fora ouviu das boas, conforme aqui bem narrado.  
Fernanda Câncio ficou indignadíssima — vejam lá, logo a Câncio iconoclasta ateia belicosa, suma-sacerdotisa da igreja Lux Frágil — com o desrespeitoso topete do candidato católico. Mal sabia ela que estava tudo acertado com o senhor prior.

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Bons e maus

Neste início de semana sondei uma dúzia de familiares e amigos acerca de dois atentados sanitários recentes, apetece-me dizer crimes, perpetrados por cá em plena pandemia:
Todos os meus inquiridos, criaturas medianamente informadas, sabiam, mais ou menos horripilados, do banquete ventúrico; apenas um estava ao corrente do protesto «antifascista», sem reparo sanitário digno de apreço.

Acabo de guglar: o arraial da Praça de Luís de Camões devolveu-me 920 resultados, sem nenhuma ou com residual indignação anticovidiana à mistura; a comezaina no "Solar do Paço", 9850 resultados recheados de imprecação e censura veemente.  

A comunicação noticiosa portuguesa merece-me, em geral, pouco respeito.  Fede a selectividade tácita; da isenção faz não mais do que ideia vaga; rege-se por cartilha e agenda doutrinárias; presta favores aos governos de turno; induz no indivíduo necessitado de informação a percepção dos factos à luz da trend ideologicamente correcta ou da conveniência circunstancial do patrão. Enfim, fervor em manobras.

Levemente a despropósito, ocorre-me, não é?, voltar a Mamadou Ba, igualmente presente na Praça de Luís de Camões
Referindo-se a André Ventura e citando apocrifamente o bispo de Leiria, o pesporrente e amabilíssimo doutor tuitou no passado dia 15,
'Será que o charlatão vai enxergar. Noutro dia foi o Marcelo a tirar-lhe Sá Carneiro e João Paulo II, agora é o bispo de Leiria a tirar-lhe a máscara. Mas como não tem vergonha na cara vai seguramente continuar a borregar berros de ódio!',
provando de uma assentada que desconhece o ponto de interrogação [não sei se na gramática senegalesa há, mas admira pouco em falantes que afirmam muito e raramente perguntam] e, sobretudo, que se está borrifando para a autenticidade das fontes, desde que lhe forneçam ladainha ajustada à causa, já que o cardeal António Marto nunca proferiu as palavras, sequer semelhantes, que Mamadou Ba lhe atribui.
____________________________________
* Assista-se, no quarteirão de vídeos do acontecimento disponibilizados pelo Arquivo Ephemera, de José Pacheco Pereira, à inanidade inflamada de que aquela gente é capaz e à incapacidade liminar daqueles tontos de entoarem razoavelmente afinados o "Grândola, Vila Morena". Metem dó quando tentam a polifonia e tornam-se assustadores na vociferação de putatitvos aerossóis de SARS-CoV-2 na parte em que 'o povo é quem mais ordena'. Bem sei que o "parabéns a você" é muito mais fácilmas o hino nacional é bem mais complicado.

Seria parcial e injusto se fechasse o verbete sem um considerando às práticas artístico-musicais entre as hostes tenebrosas de André Ventura: horror sem nome nem comiseração.

domingo, 17 de janeiro de 2021

André Ventura padece de grave mazela proparoxítona

«Somos um país mediucre por culpa dos socialistas.
Somos uma república mediucre por culpa de Marcelo Rebelo de Sousa e de António Costa.
Somos um país mediucre que nem para os seus sabe ser bom.»

Não sei de com quem Ventucre lucre, mas sei que a capital constitucional da Bolívia é Sucre.
Todavia, o que me resta principalmente saber é por culpa de quem este licenciado e doutorado em Direito, com notas altas, não aprendeu que «medíocre» é coisa esdrúxula. 

Nestas coisas e na dúvida, costumo confiar na prosódia do senhor Demarco.

Portugal no topo do mundo | Estamos cá para as curvas*

«Esta subida galopante dos números coloca agora Portugal no topo de uma lista onde ninguém quer estar. Somos o país do mundo com mais novos casos de infecção por cada milhão de habitantes e também o país com maior registo diário de mortes. Há uma semana e meia que Portugal passou para o topo da lista. [...] Os dados da universidade norte-americana de Johns Hopkins provam que por cá ainda há muito a fazer para achatar as curvas.» - TV do Balsemão, esta tarde

Ante tal evidência é-me impossível não reavivar — "Nós e os outros" — a proclamação fanfarrona do arlequim de 10 meses atrás: 
«Na nossa história vencemos sempre os desafios cruciais. Por isso temos quase 900 anos de vida. Nascemos antes de muitos outros, existiremos ainda quando eles já tiverem deixado de ser o que eram e como eram.»
Quem pode levar a sério um gabarola destes?
______________________________________

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

«Determinar», «determinações» e outras covidências


Dulcínio é dono de uma pequena confeitaria e patrão de Dulce, única empregada.
- A sua sogra costuma gabá-la muito pelo caldo verde maravilhoso que faz em casa... 
- Mas isso a que vem agora, senhor Dulcínio? Deixa-me envergonhada.
- Não se ponha a pensar coisas, veja se entende. Enquanto durar a maldição do novo confinamento, a Dulce, já que tem jeito, fica incumbida de fazer diariamente, aqui no estabelecimento, um panelão de 20 litros de caldo verde. 
- Mas o senhor Dulcínio quando me contratou foi para vender bolos, cafés, bebidas e assim, não foi para cozinhar; ah, e manter a confeitaia limpa e arrumada.
- Certo, mas isto é uma situação muito excepcional. Se volto a fechar, em três tempos vou à falência e a Dulce vai para o desemprego. Além disso, está no decreto da emergência que eu posso determinar-lhe outras funções não contempladas no seu contrato de trabalho. Quero pôr na vitrina um letreiro a dizer «Vendemos SOPA take away".
- O senhor Dulcínio desculpe-me, não é que eu não entenda a situação, mas por acaso o meu marido esteve ontem à noite a ler esse decreto, ou lá que é, e diz que o senhor Dulcínio me pode determinar que faça outras coisas mas também diz que só se eu der o meu consentimento. * 
- Muito me conta, Dulce! Não sabia que o Donato ...
- Donute, o nome oficial dele é Donute. O homem da conservatória enganou-se no registo.
- ... não sabia que o Donute também gostava de leis. Pensei que fosse mais doçaria.
- O senhor Dulcínio nunca ouviu dizer que nem só de pão-de-ló vive o homem?...
//
Inventariei por curiosidade as ocorrências de «determinar», e suas variações, no Decreto n.º 3-A/2021, o do novo confinamento**, publicado ontem no Diário da República:
«restringir determinados direitos»
«suspensão de determinados tipos de instalações»
«determina-se que os estabelecimentos de restauração e similares passam a funcionar exclusivamente para efeitos de actividade de confecção destinada ao consumo fora do estabelecimento»
«aos serviços públicos determina-se que os mesmos mantêm o seu funcionamento»
«profissionais de saúde tenham determinado a vigilância activa»
«partilha de responsabilidades parentais, conforme determinada por acordo entre os titulares das mesmas ou pelo tribunal competente»
«ordens determinadas pelas autoridades de saúde»
«assim seja determinado pelos membros do Governo responsáveis pelos respectivos serviços»
«o disposto na alínea b) do número anterior determine a impossibilidade de acesso de um trabalhador ao respectivo local de trabalho»
«aceder a locais determinados para este efeito pela DGS»
«o membro do Governo responsável pela área da economia pode, mediante despacho, determinar que os estabelecimentos de comércio a retalho»
«o preço regulado do GPL ...é determinado em (euro)/kg, de acordo com a seguinte fórmula»
«o preço regulado para o mês M é determinado no primeiro dia do mês»
«o membro do Governo responsável pela área da energia pode ... determinar novos preços regulados»
«determinados serviços públicos especialmente carecidos de suporte»
«prioridade ao encaminhamento de determinadas categorias de tráfego»
«limitar ou inibir determinadas funcionalidades»
«fixação de um limite máximo de presenças, a determinar pela autarquia local»
«pessoas em isolamento profiláctico ou em situação de infecção confirmada da doença COVID-19 que, face à avaliação clínica, não determine a necessidade de internamento hospitalar»
«o membro do Governo responsável pela área da administração interna ... determina o encerramento da circulação rodoviária e ferroviária»
«restrição à circulação de determinados tipos de veículos»
«restringir determinados direitos para salvar o bem maior que é a saúde pública e a vida de todos os portugueses»
«códigos de conduta aprovados para determinados sectores de atividade»
«podem encerrar em determinados períodos do dia»
«a realização de testes de diagnóstico de SARS-CoV-2 referidos no número anterior é determinada pelo responsável máximo do respectivo estabelecimento ou serviço»
«nos termos determinados por orientação da DGS»
«o membro do Governo responsável pela área da saúde ... determina as medidas de excepção»
«o membro do Governo responsável pela área da saúde ... determina as medidas de excepção necessárias»
«as determinações referidas nos números anteriores são estabelecidas preferencialmente por acordo»
«pode ser determinada a mobilização de recursos humanos para realização de inquéritos epidemiológicos»
«a suspensão determinada nos termos do número anterior»

Achei especial graça ao n.º 3 do artigo 10.º,
«As determinações referidas nos números anteriores são estabelecidas preferencialmente por acordo ou, na falta deste, unilateralmente mediante justa compensação»,

e, obviamente, ao n.º 2 do artigo 21.º,
* «Restauração e similares
[...]
2 - Os estabelecimentos de restauração e similares que pretendam manter a respectiva atividade, total ou parcialmente, para efeitos de confecção destinada a consumo fora do estabelecimento ou entrega no domicílio, directamente ou através de intermediário, estão dispensados de licença para confecção destinada a consumo fora do estabelecimento ou entrega no domicílio e podem determinar aos seus trabalhadores, desde que com o seu consentimento, a participação nas respectivas actividades, ainda que as mesmas não integrem o objecto dos respectivos contratos de trabalho.»

Ou seja, «determinar» tem as suas lérias e, dentro do mesmo texto, determinadas «determinações» são mais determinantes do que outras.
Quanto a mim, se o legislador não fosse tão preguiçoso na escolha das palavras talvez a lei ficasse mais inequívoca.
_______________________________________
** Confinado no meu canto plebeu da Bobadela, tenho enorme dificuldade em entender a lógica sanitária deste novo confinamento numa altura em que morrem de covid-19 mais de 100 pessoas por dia e estão em cuidados intensivos mais de 600, bem menos restritivo do que o confinamento de Março/Abril de 2020 em que se atingiram, no máximo, 37 mortos num dia e 270 internados em cuidados intensivos.

António Costa, incorrigível trapalhão da língua

«[...] Finalmente, há uma dimensão que é fundamental. Esta crise do covid reforçou-nos ainda mais a convicção que a Europa tem que recuperar a sua autonomia estratégica. Mas queremos uma Europa que seja mais autónoma mas que continue a aberta ó mundo e por isso reforce as suas parcerias com as suas vizinhanças ó leste e no sul ... relançar as relações transatlânticas com os nossos velhos aliados americanos ó com os nossos novos parceiros, que é, que são, que é o Reino Unido»

da covid
convicção de que
aberta ao mundo
ao leste e no sul [do leste e do sul]
ou com
como é 

Causa-me vergonha que o nosso primeiro-ministro continue a destratar a língua de modo tão soez.
Não me canso: o pior é que pode haver crianças por perto a ouvi-lo.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

Desejo-lhe votos sinceros

«[...]
A RTP exibiu o tuíte em que António Costa diz «desejo-lhe votos sinceros de rápida e completa recuperação».
«desejo»/«votos»/«sinceros», todo um mundo semiológico que, além de pura gamártica, remete directamente para a "retórica dos melros" de que falei em tempos.
[...]».

«[...]
Além disso, António Costa também deixou votos sinceros de rápida e completa recuperação. O único desejo que se apresenta é o do primeiro-ministro, o que acaba por ser contraproducente. Quando temos necessidade de dizer que estamos a ser sinceros, parece que poderia haver suspeitas de que a nossa sinceridade fosse, de algum modo, falsa. No que respeita às melhoras quase todos desejam que sejam rápidas mas quanto à recuperação há divergências ideológicas importantes, que se reflectem no adjectivo escolhido.
[...]»

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Vírus corona, Sol maior *

Decorreu pelas 13h00 de hoje a 6.ª descontaminação das ruas de Bobadela, por um amola-tesouras. [fase 1]   [fase 2]

5.ª, Senhora

4.ª, Resssuscitado  -  3.ª, Crucificado

2.ª, Senhora da limpeza  -  1.ª, José operário
_________________________________
* É mesmo, garanto,
 a gaita do amolador
estava armada em Sol maior.

João Cutileiro, 26.Jun.1937 - 05.Jan.2021

Da meia dúzia de obituários que li na morte de João Cutileiro elejo o de José Cabrita Saraiva.
«[...]
Tanto nas palavras como na arte Cutileiro exprimiu-se sempre de forma sincera, acutilante* e descomplexada, sem medo de ofender. [...]
E foi "para cima" que concebeu o seu polémico monumento ao 25 de Abril no Parque Eduardo VII, em 1997. A obra causou incómodo e até escândalo pela sua semelhança com um falo em ejaculação - o que lhe valeu o epíteto de "pirilau". [...]
O que está nos Restauradores também é um pirilau, não é? E no Rossio, o D. Pedro IV, lá em cima também é um pirilau. São todos pirilaus. E o Cristo Rei, não é apirilauzado? (J. Cutileiro)
[...]»
___________________________________
* JCS não terá feito de propósito, mas lá que «acutilante» vai bem com «Cutileiro», isso vai.

A saúde do arlequim

Quinta-feira, 29 de Dezembro de 1864.
Na primeira página da edição n.º 1 do Diário de Notícias informava-se:
Suas Magestades e Altezas passam sem novidade em suas importantes saudes.

Decorridos 156 anos, verifico que o apenas aparente ridículo daquela informação pede meças ao noticiário alucinante, realmente ridículo, em torno da saúde de um frenético arlequim hipocondríaco.

Ré menor

«Fiz essa música quando conheci minha mulher Elodie, estávamos no início da relação e a composição mostra esse clima de incerteza, comum no início dos relacionamentos. [...]»
_______________________________________
Esta guitarra nova, construída em 2020 por Vicente Carrillo para Yamandu Costa, tem uma sonoridade de outros mundos. Fará quando envelhecer...

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Alberto Gonçalves roçando a abjecção

Na sua mais recente crónica semanal, no Observador, Alberto Gonçalves, "o meu fascista de estimação", caracteriza o que acontecera na América dias antes

«[...]
um episódio como o de quarta-feira, em Washington, quando manifestantes favoráveis a Trump e incitados por este invadiram o Capitólio
[...]
uma grotesca tentativa de assalto ao Capitólio que se resolveu em poucas horas, infelizmente com vítimas, felizmente sem grandes danos materiais.
[...]
É evidente que a actuação de Trump foi vergonhosa. Mas vergonha maior, caso a tivessem, é a dos que alertaram para a gravidade do recente esboço de golpe
[...]»

O mais do texto é comparação com a selvajaria e violência avulsa do lado oposto — democratas, blmantifas e esquerdistas em geral — que AG estriba, para resumida ilustração, num punhado de acções de rua ocorridas nos cinco anos da presidência republicano-trumpista, desmascarando e insurgindo-se contra o modo como o jornalismo enviesado, das causas correctas, as veio, ou não, noticiando.

Sou um fã antigo [há coisas de prolação mais fácil e agradável do que «um fã antigo»...] da graça, da ironia, da argúcia e da redacção esmerada de AG. Revejo-me não raro no seu ponto de vista como, de resto, em parte considerável da crónica em apreço.
Mas, para caracterizar o acontecimento no Capitólio, e a envolvente política que o determinou, não ter, numa crónica de 10 parágrafos senão as quatro frases moles, quase condescendentes, que acima reproduzo, desculpe lá, Alberto, isso parece-me indigno de quem tanto ama a América. E eu sei como a ama.

Por via de dúvidas considero relevante o «Mas» que evidenciei.

Inês Sousa Real, metralhadora daquilo que é *

ÚLTIMA  HORA
A líder parlamentar do PAN diz «congamos».

«Muito bom dia a todos e a todas **. Nós tivemos hoje oportunidade de ouvir os especialistas no rescaldo daquele que foi um período de levantamento, também, de algumas medidas de confinamento ainda que com diferentes graus de restrição. Os dados são bastante claros e a nós parece-nos que estamos perante aquilo que é um tsunami sanitário» 

«E não se torna perceptível as medidas que têm continuado a ser tomadas, até que possamos ter um plano de vacinação plenamente aplicado ao nosso país a par das medidas evidentemente sanitárias que têm continuado a persistir e que congamos debelar esta crise. Agora efectivamente estamos a atravessar um momento complexo. O PAN não deixará por isso de acompanhar aquela que é a renovação do estado de emergência por esta razão, mas exige-nos a todos enquanto eleitas e eleitos **, e também aos nossos governantes **, respostas mais cabais à crise sócio-económica para garantir que ninguém fica de facto para trás»
Lisboa, Infarmed, 12.Jan.2021 

Tal chefe, tal escudeira, o psitacismo gárrulo do costume. Mas o que deveria preocupar a nação é que uma licenciada em Direito, mestrada e pós-graduada, com toda esta afirmação institucional, não consiga conjugar o verbo conseguir. Nem o correcto «possamos» a redimirá da indigência gramatical.
Restava que Luís Oriola, mártir português da era covídea, fosse a tempo de retirar o acento do 'i' para poupar a parte menos barulhenta da audiência a tão tosco solecismo. Não percebi se o fez, mas duvido de que tenha conseguido, dada a velocidade vertiginosa a que a deputada Sousa Real metralha.   
_______________________________________
* Não sei porquê, sempre senti qualquer coisa de terrorista no discurso do PAN.

Ai Inês, ai Paula Inês, que nem o código de linguagem da seita sabes praticar com um mínimo de coerência! Então não deveria ser a todas e a todos enquanto eleitas e eleitos, e também às nossas governantasaos nossos governantes? Ai isso é que deveria. 

«Última hora» quanto dura?

Pelas 10 da noite de ontem, segunda, recebi uma sms a informar que o arlequim tinha «testado positivo», formulação discursiva horrível; «positivou» não seria melhor.

Quando Portugal atingia 489.293 casos de infecção desde o início da contagem (em português hodierno, “contabilização”) em Março de 2020, o de Marcelo Rebelo de Sousa haveria de ser suficientemente extraordinário e singular — tudo à volta de um arlequim é "féerie" — para merecer uma irrupção de «Última hora» nas televisões; na CMTV chamam-lhe «Alerta CM!»
Fiquei curioso em avaliar qual das quatro grandes tê-vês teria sido a primeira a dar a notícia e durante quanto tempo a manteriam classificada como de «última hora». 

Fui à box e apurei.
A primeira foi a TVI, às 22h02. Manteve o oráculo de «última hora» até às 00h07 de hoje.
A segunda foi a RTP, às 22h04. Manteve o oráculo de «última hora» até às 00h03 de hoje.
A terceira e a quarta, ex aequo,  foram  a SIC e a CMTV, às 22h07. A SIC manteve o oráculo de «última hora» até às 00h47 de hoje.
A CMTV, que se gaba permanentemente de ser a «melhor» e a «primeira!»  desta vez chegou cinco minutos depois da primeira; em contrapartida, às 01h30 de hoje mantinha a notícia em «alerta» e sei lá por quantos séculos a manterá. Julgo até que só por falta de espaço na pantalha não estão a dar ainda como «Alerta CM!» a notícia do nascimento do primeiro tiranossauro.

O mais interessante para mim foi confirmar a porfia, em nome da fixação e cloroformização da audiência, com que as televisões esticam até ao limite da insensatez o tamanho de um contexto temporal — «última hora» — que uma hora que durasse já seria demais. A RTP, que costuma ser a mais sóbria das quatro, fez render o peixe durante duas horas (!); a SIC, duas horas e 40 (!).
Precisamos de que McLuhan volte cá.

A RTP exibiu o tuíte em que António Costa diz «desejo-lhe votos sinceros de rápida e completa recuperação».
«desejo»/«votos»/«sinceros», todo um mundo semiológico que, além de pura gamártica, remete directamente para a "retórica dos melros" de que falei em tempos.