terça-feira, 31 de janeiro de 2012

CCB - António Mega Ferreira | Vasco Graça Moura [1]

«A mais cómica fotografia publicada na imprensa, em tempos recentes, é a da passagem de testemunho, de António Mega Ferreira para Vasco Graça Moura, à porta do Centro Cultural de Belém. A coreografia é elementar – o primeiro sai e o segundo entra – e admite imaginariamente a reversibilidade: o que entra podia estar no lugar do que sai e o que sai podia estar no lugar do que entra. Os dois estão ligados por uma função gramatical, a conjunção copulativa e, tal como Bouvard e Pécuchet.
[…]
Eles são ur-fenómenos, fenómenos originários, morfologias goethianas, quase arquétipos, perante os quais não há história a desenvolver-se no horizonte. Este bloqueio de toda a possibilidade do novo e a submissão ao irreparável, o eterno retorno do mesmo, é a regra em que vivemos em todos os domínios.»

Alberto Gonçalves, abundante má-fé?

«A capital europeia de uma certa cultura
Descansem os que viam em risco a posição de Portugal na Europa. O risco sumiu, e não foi graças a empréstimos, troikas, austeridade, impostos, rigor ou fenómenos afins: bastou organizar em Guimarães a Capital Europeia da Cultura para que provássemos ser europeus de pleno direito.
Pelo menos é essa a opinião de Jorge Sampaio, ex-presidente da República e actual presidente do Conselho Geral da Fundação Guimarães 2012, funções que lhe garantiam 14 300 euros mensais e que a demagogia da crise terá posteriormente reduzido para uns dez mil, insuficientes para as despesas correntes de um chefe de Estado na reforma, mas suficientes para o dr. Sampaio afirmar que a cultura não é um desperdício: é um investimento.»
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 «Publica o Diário de Notícias, na sua edição de 29 de janeiro, um artigo de opinião da autoria de Alberto Gonçalves onde se refere, com evidente e abundante má-fé, à cerimónia inaugural de Guimarães 2012 Capital Europeia da Cultura.
[…] não posso pactuar com a falsidade e por isso solicito com toda a veemência o desmentido formal da afirmação que imputa ao antigo presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, o recebimento de um vencimento pelo exercício do cargo de presidente do Conselho Geral da Fundação Cidade de Guimarães. O presidente do Conselho Geral, como aliás todos os restantes membros desse conselho, desempenham as suas funções pro bono. A Fundação atribui a cada um uma senha de presença no valor de 350 euros, sujeitos a IRS, verba com a qual fazem face a despesas de deslocação e estadia em Guimarães para as três ou quatro reuniões anuais que efetuam.»

E agora, caro Alberto Gonçalves? Seppuku?

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Manuel Maria Carrilho | Aníbal Cavaco Silva

«Roma não paga a traidores”, dizia, inocentemente António Guterres, a propósito do PS. Mas Roma pagou a Manuel Maria Carrilho, que traiu Guterres com estrondo e dessa traição fez carreira política e oportunidade mediática, sabendo como a nossa imprensa adora traições e insídias. Sem aprender a lição, Sócrates deu-lhe de bandeja a eleição garantida para a Câmara de Lisboa, que ele conseguiu perder, por exclusiva culpa e vaidade própria. E, depois de muito suplicado, deu-lhe o melhor emprego do Estado – o de embaixador da UNESCO, em Paris. Para bem conhecer o personagem, vale a pena ler o que ele agora escreveu sobre Sócrates no “DN” da passada quinta-feira. Está lá tudo, toda a história da queda de Roma. Mas aqui fica o aviso: é leitura hardcore, não recomendável a espíritos impressionáveis. A mim, pelo menos, causou-me uma náusea irreprimível ver alguém morder a mão que lhe deu de comer.

Francamente, não entendo o espanto com as "infelizes" (é assim que se deve dizer) afirmações do sr. Presidente da República. Ao fim de trinta anos no topo da política, sufragado pelo país em não sei quantas eleições, ainda há quem não conheça Aníbal Cavaco Silva? Não houve ali sombra de insensibilidade, de falta de jeito, de infelicidade, como tantos disseram. Foi, tão-somente, Cavaco igual a si próprio. Nunca, sinceramente, consegui perceber o respeito reverencial com que Cavaco Silva foi sempre tratado por tantos – e alguns bem melhores do que ele. Nunca consegui perceber o mito que se criou à volta de um homem a quem jamais vi um gesto de verdadeira grandeza. Pelo contrário, sempre senti, desde o primeiro dia, que ele se acha o centro do mundo, o epicentro de todas as virtudes, acima e além de todos os outros. Por isso, não o condenem pelo deslize: condenem-no pela sinceridade. Os que não votaram nele.»

sábado, 28 de janeiro de 2012

Habemus papam

«Aliás, os próprios camaradas que se abstiveram assumiram que a partir de hoje nós éramos o secretário-geral deles.»
- Arménio Carlos, esta madrugada à Antena 1, quando, com 113 votos a favor e 28 abstenções, acabara de ser entronizado como novo secretário-geral da CGTP.
O plural majestático é apenas um pormenor - todavia nada despiciendo - na vasta e eficacíssima liturgia que os comunistas beberam na Igreja Católica.

Quanto ao electricista mestre doutor Carvalho da Silva [rendido hoje pelo camarada Arménio da Carris], de que li e escutei - com empenho e atenção inversamente proporcionais ao proveito - praticamente tudo o que berrou nos últimos 25 anos, começa a ver-se-lhe reconhecida uma beatitude quase unânime nas zonas ditas de boa consciência cívica, culta e progressista. Turiferários de alto gabarito [Daniel Oliveira, Mário Soares, Clara Ferreira Alves ...] já lhe estão denodadamente a tratar da parte Lula, que a parte da Silva trá-la ele do berço, o que, convenhamos, é meio caminho andado para Belém.
E com três letrinhas apenas
se escreve a palavra mãe
que entre as palavras pequenas
não é maior do que a pai

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

O erotismo e o medo

«tal como a carga erótica, o medo é um impulso universal que se fragmenta em inúmeras idiossincrasias no ponto de chegada. Ainda antes de chegarmos ao problema da qualidade de execução (e só neste aspecto, arriscaria que se fazem para aí uns cinco bons filmes de terror por década), há sempre uma medida mais limitada de sucesso que somos forçados a julgar: a eficácia com que o que se passa no ecrã opera no nosso restrito repositório pessoal de neuroses e fobias. A raridade é o filme que consegue o delicado acto de equilibrismo entre o que é universal (sem resvalar para o vago) e o que é pessoal (sem nos tentar impor fobias alheias).
[…]
“The Innocents” é uma das coisas mais perversas jamais filmadas, e há momentos em que o facto de o filme ter sido distribuído em 1961 parece tão inacreditável como uma aparição sobrenatural. A dada altura, um beijo de boas-noites entre Miss Giddens e Miles (que tem, supostamente, 12 anos) prolonga-se durante vários e incómodos segundos, mas a acumulação faz com que qualquer imagem ganhe uma aura de obscenidade: o cadáver de um pombo debaixo de uma almofada, um insecto a rastejar da boca de uma estátua, um pêndulo a embater ritmicamente contra uma janela, ao som de uma voz fantasmagórica a implorar “love me, love me!”.
“The Innocents” combinou as dificuldades de universalizar o erotismo e o medo e instrumentalizou-as a seu favor, apostando na inevitabilidade do primeiro em produzir incómodos para potenciar o incómodo do segundo. Em vez de tentar partilhar as suas idiossincrasias, usou-as para nos assustar. E, como qualquer pessoa com acesso à Internet pode verificar, poucas coisas conseguem ser mais assustadoras do que as fantasias eróticas de estranhos.»

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Ainda o deslize e a gafe do senhor Presidente*

«Pegue-se por onde se pegar, Cavaco Silva cometeu um deslize grave de maneira confusa. Infelizmente para ele, nem a confusão escondeu a gravidade nem o deslize escapou à condenação geral. Nesse sentido, o Presidente em funções sai inevitavelmente a perder na comparação com os antecessores imediatos. Mário Soares, senhor de um discurso límpido, era (e é) livre de dizer as asneiras que entendesse sem que três quartos da nação lhe caíssem em cima. E Jorge Sampaio embrulhava os palpites em tamanho nevoeiro que ninguém conseguia sequer compreender o assunto em causa, muito menos descobrir eventuais disparates perdidos lá no meio. Cavaco Silva, que não goza da misteriosa impunidade do primeiro, não possui o exoterismo retórico do segundo e, algo injustamente, não é figura grata à esquerda, expõe-se às consequências das respectivas palavras.
Dado que, no episódio das reformas, as palavras roçaram a ofensa e insinuaram um preocupante alheamento da realidade, as consequências não tardaram e não se caracterizam pela moderação. Nos media, na Internet e na rua lusitana, o povo passou os últimos dias a despejar ódio ou escárnio sobre Cavaco Silva, de súbito erguido a símbolo das desgraças pátrias.»
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«Cavaco e os “amigos”
Ao fim de trinta e cinco anos, um político “também tem direito às suas gafes”, comentário de Luís Filipe Menezes na Antena 1 a propósito da gestão económica privada do Presidente da República. O prócer de Gaia, celebrizado por uma choradeira à saída de magna reunião “laranja” no Coliseu dos Recreios, deve pensar que […]»
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* Como se este Presidente não fosse todo ele um ingente deslize, uma gafe mastodôntica, uma alvar miséria salivante.

PS
Para a pessoa que veio ao e-mail achar aberrante que, execrando, como desde sempre execro, a doutora Manuela Ferreira Leite que o doutor Alberto Gonçalves tanto enaltece, me louve tão profusamente nas prosas do doutor Alberto Gonçalves, inquirindo a rematar «Qual é afinal o seu partido, ó senhor Plúvio?», aqui vai por extenso:
- abomino a doutora Manuela Ferreira Leite na razão inversa e indirectamente desproporcionada de quanto admiro o doutor Alberto Gonçalves;
- o meu partido é, desde que acabaram com o Nestum de figos, o atum Tenório. Indefectivelmente.

Sócrates à luz de Carrilho

«Conheci José Sócrates em 1995, quando ambos integrámos o governo liderado por António Guterres, ele como secretário de Estado do Ambiente, pasta então entregue a Elisa Ferreira. Mantive sempre com ele relações de regular e frontal atrito, a começar numa lista de nomeações que ele queria que eu, como ministro da Cultura, fizesse em Castelo Branco, e a acabar, como se sabe, com a minha recusa em aceitar que Portugal apoiasse para a liderança da UNESCO um facínora com largo cadastro que lhe tinha sido sugerido pelo seu "amigo", o então ditador egípcio Hosni Mubarak, que ameaçava queimar todos os livros da cultura judaica...
Pelo caminho, as fricções foram muitas e quase sempre do mesmo tipo. Devo dizer que nunca vi em José Sócrates convicções socialistas - no sentido europeu de "social-democrata" - mas antes uma atracção pela paródia em que infelizmente o socialismo tantas vezes se tem tornado, deslumbrado com o capitalismo financeiro, as novas tecnologias e os malabarismos da comunicação. Vivendo sempre perto do mundo dos negócios e dos futebóis, e desprezando acintosamente o conhecimento, a cultura ou a educação, com o mais perigoso dos desdéns, que é o que se alimenta do ressentimento e da inveja.»

Ressentimento, inveja. Pois.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Álvaro, caro Álvaro

[…]
Você conhece algum país sério, Álvaro, onde uma empresa possa roubar os clientes, desfalcar o Estado e fazer batota sem consequências? Conhece algum país onde os responsáveis pelo BPN e pelo BPP ainda não tivessem sido julgados?
[...]
Tenho pena de si, Álvaro.»

Quo usque tandem abutere, Cutileirus, patientia nostra?

Qual é o predicado na oração de que Manuel Fraga Iribarne é sujeito, raios?
mas ficando-lhe também o quê, foda-se?
Uma pessoa lê, relê, procura, reprocura e nicles.
Até quando irá o José Cutileiro supliciar-nos com a longa apneia sádica do eterno primeiro período dos seus obituários? No In Memoriam do ilustre galego, não faz a coisa por menos de 318 [!] palavras antes do primeiro . final, em Aznar.
Tenha dó, senhor embaixador.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Certos pormenores

impedem o Metropolitano de Lisboa de ser excelente em toda a linha.
Este é um deles.

Determinada gente deveria ser proibida de escrever nas portas.

Uma coisa assim

Gafe do senhor Presidente, deslize do senhor Presidente, o senhor Presidente em momento menos feliz...
Por favor, deixem-se de merdas, poupem-nos a eufemismos cínicos.
A República Portuguesa tem, como sempre senti, um Presidente miserável. Dedicar-lhe  um pingo de desculpa ou um grama de caridade é ofensa à inteligência e aos bons sentimentos.
O político Aníbal Cavaco Silva é o maior e mais extenso tormento que pôde suceder na nossa democracia.
Que mal fez Portugal para nos calhar uma coisa assim?
Que honra poderão ter experimentado sujeitos culturalmente arejados como, nomeando ao acaso,  Miguel Poiares Maduro, João Lobo Antunes, Vasco Graça Moura, Alberto Gonçalves, Nuno Crato, Fraústo da Silva ou Francisco José Viegas, em adornar a eleição e a reeleição para a mais alta magistratura de um soturno e medíocre videirinho desta estirpe?
PSD, PeSaDelo; Cavaco, seu totem.

Enfim, é o que acho.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O capitalismo e a burguesia

«Marx, que tinha enunciado como axioma da economia política que os coveiros da burguesia seriam também os coveiros do capitalismo, estava longe de prever o que já está a ser anunciado por alguns índices: que o próprio capitalismo será em breve o coveiro da burguesia.»

Acordo Ortográfico [35]

«Tenho assistido - sem grande vibração, diga-se - à troca de opiniões, mais ou menos acaloradas, mais ou menos profundas sobre a questão do Acordo Ortográfico. Descaracterização da língua, submissão ao brasilês, com tudo se argumenta, até com o "matriotismo" obstinado do "foi assim que me ensinou a minha santa professora da escola primária".»

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Acordo Ortográfico [34]

«Eu não sou pela “antiga ortografia” por caturrice. Estou contra o “acordo” porque me parece uma decisão meramente política e económica, sem verdadeiro fundamento cultural.
[…]
Dizem os acordistas que a nova ortografia “simplifica” e “facilita a aprendizagem”. Toda a gente sabe o que significa “facilitar a aprendizagem”, e os resultados que isso deu no ensino. E se a intenção é “simplificar”, que tal escrevermos todos em linguagem de telemóvel? Por mim, continuarei antigo.»
Pedro Mexia, “Antiga ortografia| Expresso/Atual, 14.Jan.2012
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Nota do Expresso:
«Pedro Mexia escreve de acordo com a antiga ortografia»

sábado, 14 de janeiro de 2012

Era uma vez uma lâmpada

«Byron é uma lâmpada, criada entre milhares de irmãos num viveiro industrial conhecido como Paraíso das Lâmpadas Bebés. Como todas as outras, é dotado de consciência, mas também de algo mais.
[…]
Uma improvável sequência de acontecimentos ajuda Byron a escapar-se aos tentáculos da Phoebus, uma longa odisseia que o vê ser despejado numa retrete, percorrer o Elba até ao estuário, flutuar à deriva no Mar do Norte, ser recuperado e novamente perdido por um padre luterano, transportado até um comício nazi, resgatado por um órfão judeu.
[…]
De todas as formas literárias, a alegoria é uma das mais arriscadas, mas talvez a menos vulnerável à obsolescência. Na vida de Byron, Pynchon criou uma alegoria imperecível sobre um objecto inanimado que incorpora a experiência humana elementar, perpetuamente equilibrada entre impulsos transitórios e utopias de imortalidade: a resignada aceitação de que o conhecimento nem sempre expande o perímetro do possível, e de que o mais valioso nem sempre é comunicável.»
Rogério Casanova, “A vida de Byron”, sobre “Gravity’s Rainbow”, de Thomas Pynchon [1972] | Público/Ípsilon, 13.Jan.2012

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Portugal no UEFA Euro 2012

«Semelhantes actividades exigem instalações à altura e não se compadecem com as pocilgas de três ou quatro estrelas que albergam espanhóis, italianos, ingleses, alemães, etc. Para os outros, o hotel é o lugar onde os campeonatos começam. Para a “equipa de todos nós”, é o lugar onde frequentemente terminam. A 33 mil [euros] por dia, esse particular Euro já ganhámos – a menos que a Grécia nos estrague novamente as contas.»

Matá-los no berço teria ficado muito mais barato

António Barreto- Até onde é que certo tipo de intervenções cirúrgicas, com 70 anos - é a minha idade -, 70 anos, 80 anos, 90 anos, 95... Até onde é que se pode ir? Qual é a qualidade de vida que se obtém com certo tipo de investimento? Tudo isto tem que ser discutido e tem que ser discutido racionalmente.
Há países onde se discute se o serviço nacional de saúde deve ou não tratar fumadores – eu sou fumador. Há países onde se discute se se deve pagar a hemodiálise a pessoas com mais de 70 anos – eu tenho 70 anos.
Ana Lourenço, para António Barreto– Não acha abominável que se discuta se alguém com 70 anos tem direio à hemodiálise ou não?
Manuela Ferreira Leite- Tem sempre o direito, se pagar.
“Contra Corrente”, anteontem, SIC N, a partir mais ou menos do minuto 25:00

"Litemerer Rfaeani Aelu"

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«Se queres mudar para melhorar, chama o António
Se queres ter maior prazer, chama o António

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Marlbora

Os mercados isto, os mercados aquilo, os mercados ditam, os mercados dizem, os mercados querem, os mercados fazem, os mercados acontecem... Já não há pachorra para a conversa dos mercados.
- Bora, pá?
- Aonde, pá?
- Ao MARL, pá.
- Bora, pá.

Acordo Ortográfico [33]

«Este acordo ortográfico é o produto não de uma evolução natural, impregnada na prática do quotidiano mas uma imposição artificial a que o Estado de algum modo nos quer obrigar Este acordo também é, na minha opinião, uma expressão da submissão às maiorias populacionais, neste caso – sejamos directos – é a submissão ao Brasil.
Uma língua só se enriquece na diversidade, e empobrece na unicidade por via legal de artificialismos. ...
Não me pelo pelo pelo de quem para para desistir.
Esta situação parece-me absolutamente inusitada, despropositada.
Pela minha parte, resistirei quanto puder.»

Ana Cássia Rebelo,

imperatriz.

«[...] bem vistas as coisas, a língua da outra, grossa, comprida, autêntico falo que crescia e entumecia quando entrava dentro de si, era maior, incomparavelmente mais competente, do que o pénis do velho maçon, cansado de tanto uso, envelhecido, mirradinho como uma salsicha frita de véspera.»
"Exosqueleto", 10.Jan.2012

Lucidez

- Vem-te.
- Já vou.
- Vem-te, porra.
- Já venho.
- Já me vim, foda-se.
- Podes ir.

Quando me dizem

«devo dizer-te» dou meio passo atrás: 1/4 de passo de desconfiança, outro quarto de reservado desdém. Estou decerto perante pessoa que se julga mais importante do que é.
A minha mãe nunca me disse «devo dizer-te».

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O careca de óculos:

- Se descubro o cabrão que me gamou o d ...

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

João César da Neves reza por Christopher Hitchens

«Eu acredito que Deus existe, Hitchens tinha a certeza que não, mas ninguém realmente sabe. Um dia veremos, mas então será demasiado tarde.
[…]
As bases da nossa existência, mesmo se nunca conhecidas com certeza, têm de ser os pontos mais firmes da nossa identidade. Por isso se defende com mais afinco aquilo em que se acredita do que o que sabemos com segurança. Há mais calor na proclamação da justiça que do vento*.
[…]
o ateísmo é a certeza de que a vida não tem sentido e a morte é o nada. Por isso era tão importante observar o fim de Christopher Hitchens. Este autor, a quem os conhecidos descrevem com uma personalidade encantadora, sabe agora se a sua aposta é certa ou errada. Como pessoa religiosa, rezo sinceramente pela alma que ele achava não ter.»
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* Bem visto.

Dois imarcescíveis Pachecos

«De repente aparecem em Portugal, escritas por escritores portugueses*, duas biografias sérias, que, na melhor tradição anglo-americana, investigam toda a documentação disponível para oferecer duas histórias no sentido histórico e cronológico, de dois escritores de vida e de obra fascinantes […]»

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* João Pedro George e Nuno Costa Santos

Eu gostava tanto, tanto, tanto do Fernando Assis Pacheco.
"Puta que os pariu! - A biografia de Luiz Pacheco" foi o presente de Natal das minhas filhas. Lindas!

O que os estrangeiros acham de nós

Outra suculenta peça, em prosa magnífica, do sociólogo Alberto Gonçalves.

«Se um escritor nacional de razoável prestígio resolvesse encher duzentas páginas de considerações acerca dos Estados Unidos ou da Alemanha, seria natural que poucos ou nenhuns americanos ou alemães sequer reparassem no esforço. Porém, qualquer viajante ou turista que após quinze dias no Douro ou um fim-de-semana em Albufeira tenha imortalizado a experiência em três parágrafos de uma reportagem vê os parágrafos esmiuçados à lupa pela “inteligência” indígena. Com sorte, cada parágrafo originará cinco de interpretações num semanário e, quem sabe, uma entrevista televisiva em horário nobre.
[…]
A avalanche censória e revisionista da correcção política, que nas décadas recentes passou a discriminar as pessoas por etnia, género e orientação sexual, encheu os currículos universitários ocidentais de estudos das minorias, dos negros ao feminismo, dos grupos LGBT aos adeptos do Belenenses.
Portugal em peso foi, avant la lettre, objecto dessa paixão “identitária”, responsável pela agregação dos indivíduos de acordo com os atributos percepcionados pelo exterior e totalitários na sua definição. Independentemente do que cada um de nós seja, o importante é que somos portugueses e que ser português implica isto, aquilo e aqueloutro. É-nos indiferente que nos chamem cosmopolitas ou rústicos, festivos ou lúgubres, românticos ou pragmáticos, apáticos ou desenrascados, caóticos ou organizados: o simples facto de nos chamarem alguma coisa, logo que genérica e irreformável, é sinal de que dão pela nossa existência e isso é o bastante e um consolo.»

domingo, 8 de janeiro de 2012

Acordo Ortográfico [32]

«É fascinante que um pequenino bando de ociosos tenha decidido corromper a língua de milhões. O fascínio esvai-se quando se percebe que os ociosos atingiram os intentos. O Acordo Ortográfico, criação de arrogantes com uma missão, é oficial e está aí, perante a complacência dos poderes públicos em princípio eleitos para defender o país e não para o enxovalhar deliberadamente.
[…]
Por mim, os brasileiros e os moçambicanos são livres de adoptar o húngaro sem que eu os censure ou sequer note a diferença. Não sou brasileiro nem moçambicano. Sou português e, não fosse pedir demasiado, dava-me jeito redigir na língua em que cresci.
[…]
se os maus-tratos à língua já eram habituais, não eram obrigatórios. E essa é a diferença entre temer pela vida de um moribundo e assinar, oficial e urgentemente, o respectivo óbito.»
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* Cumprida a primeira rodada, de segunda a domingo, desde que o DN aderiu, em 2 de Janeiro corrente,  ao novortografês, passo a denunciar, para vexame público e morigeração dos costumes, os seguintes ilustrados colunistas e opinantes do jornal que continuam a redigir em português a.C. [antes de Casteleiro]:
José Bandeira - Anselmo Borges - Alberto Gonçalves - Carolina Gouveia - Vasco Graça Moura - Manuel Alegre - Celeste Cardona - Baptista-Bastos - Joel Neto - Pedro Marques Lopes - Ana Bacalhau - Gonçalo M. Tavares - José Adelino Maltez - Paulo Pereira de Almeida - Pedro Bidarra -  João César das Neves - Joaquim Jorge - Manuel Pinho - Manuel António Pina - Mário Bacelar Begonha - Paulo Baldaia.
Caso para dizer que o vetusto e respeitável diário da Avenida da Liberdade é um coio de insurretos**.
O tempora, o mores! [Não há Séneca e Terêncio sem Cícero...]

** Subespécie novortográfica de insurrectos

sábado, 7 de janeiro de 2012

Homo sum, humani nihil a me alienum puto. [1]


«Eu sempre tive simpatia pela Barbie, porque nada do que é desumano nos deve ser estranho.»

A vergonha e a lei

«como dizia Séneca, a vergonha deve restringir aquilo que a lei não proíbe.»

Acordo Ortográfico [31]

«A filogénese da escrita mostra que esta é autónoma do oral, o que levou Barthes a afirmar: “Tudo se passa como se a escrita já tivesse sido inventada antes de ser posta em relação com a língua, antes de ser fonetizada.”
[…]
É certo que a resistência a uma nova ortografia só pode vir de quem foi constituído pela ordem da ortografia anterior. Mas nem por isso ela pode ser vista com o simplismo do professor Malaca Casteleiro que, com uma perna na Academia, outra na escola primária, e a cabeça numa órbita que não é a da Linguística, afirma: “Se pensarmos nas crianças que estão a aprender a escrever, para elas é muito mais fácil escrever sem as consoantes mudas.” Este álibi manhoso da literacia foi o mesmo que serviu para expulsar em larga escala os textos literários do ensino da língua.»
_________________________
* O António Guerreiro, que não é cabotino nem enfatuado, é dos que se deixam, desde a primeira hora, publicar no Expresso em novortografês. Acho que o compreendo. E acho que também compreendo os nem cabotinos nem enfatuados Manuel S. Fonseca, Pedro Mexia ou Miguel Sousa Tavares, por exemplo, ao não se deixarem, por enquanto, publicar em novortografês.

Ana Lourenço e o ónus da espera

Quando tem de interromper para reclames, a adorável Ana Lourenço usa dizer
Fazemos um intervalo e voltamos com a actualidade.
Espero por si, até já.
Ora o que se passa é que um minuto depois, se a publicidade só tiver durado isso, quem continua à espera de que a Ana Lourenço volte é o telespectador paciente e não a sedutora Ana. Por isso,
Espere por mim, que eu já volto.
é que a enfeitiçante Ana Lourenço deveria dizer. E agradecer.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

6 de Janeiro

- ...
- Os reis esmagam?

"O meu pipi - Sermões"

Tiago Bartolomeu Costa- «Há uma poética da inocência, do prazer puro, ao longo destes sermões. Encontro essa apologia no Sermão da Montada e, em particular, nesta passagem: “Nota, Leocádia, que fornicamos à margem da moral: tanto da católica, que subordina as fodas à procriação, como da moral burguesa, que as subordina ao amor. Nós estamos fodendo intransitivamente, sem outro propósito que não seja foder”...»
Autor dos "Sermões"- «No meu caso, não se trata de procurar ser puro, trata-se de não conseguir evitá-lo. Julgo que o problema remonta à minha infância, pois soube desde muito cedo o que era o sofrimento: minha avó fazia criação de “pathos”. E o padecimento, como sabe, purifica. A mim, deixou-me mais puro do que gostaria, pois acredito que há uma única tentação na qual não devemos cair: a da santidade. Aquilo que toma por desejo de pureza é, na verdade, intenção de me livrar dela. Luto contra a minha própria natureza – e perco. Invejo aqueles rústicos que se dizem incapazes de exprimir através de palavras o que estão a sentir. Ora, eu só sei o que estou a sentir porque consigo exprimi-lo através de palavras. Eles são tomados por sentimentos inefáveis, cuja frágil pureza não suporta a tradução para as impuras palavras; eu exprimo-me exclusivamente através de palavras, o mais artificial e traiçoeiro dos recursos, e acrescento pureza ao que já era puro.
Oh, antinomias do caralho!
[…]
Agora, a revista “Ler” reclama ter feito investigação minuciosa e indesmentível e sustenta que eu sou mesmo Ricardo Araújo Pereira. Parece que, tal como eu, ele tem conhecimento de um livro intitulado Bíblia e sabe da existência de um escritor obscuro chamado Shakespeare. Que se há-de fazer? Enfim, não duvido que haja quem se gabe de ser o Pipi. Pelos vistos, eu sou o único que não o faz. A questão da identidade é menos interessante do que parece. Um nome não contribui em nada para definir alguém: hoje sou um homem que gosta de tetas grandes, mas amanhã posso ser um homem que gosta de tetas ainda maiores. Sou o mesmo homem? Posso ser designado pelo mesmo nome? Não sei, nem interessa. O que tenho feito é concentrar-me nas tetas, e deixar de lado a identidade – que não traria esclarecimento, mas confusão. Hegel escreveu que a identidade é a identidade da identidade e da não-identidade. Que quereria ele dizer com isso? Não faço ideia, ainda estou a pensar em tetas. E sou contra tudo o que possa desviar a atenção das tetas.»
O evangelho segundo o nosso pipi” – Tiago Bartolomeu Costa à conversa, por email, com Ricardo Araújo Pereira ** | Público/Ípsilon, 06.Jan.2012

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** Por via da presunção de inocência, como se fosse possível ao criador escapar da sua criação, advirto o leitor crédulo de que o troço semiótico delimitado por * e ** é da minha inclusiva desresponsabilidade, aproveitando para aduzir este delicioso e edificante excerto do "Sermão às Putas" em que o Miguel Guilherme faz de Miguel Guilherme e o Ricardo Araújo Pereira de ausência ressonante.