Patrícia Gaspar, da Autoridade Nacional de Protecção Civil [ANPC], é incapaz de abandalhar a conversa. Conforme anotei, esmera-se no rigor neurocirúrgico das quantidades. Assim, não espanta que, seguidora das melhores doutrinas, também contabilize feridos em vez de simplesmente os contar. Ainda ontem de manhã, dada a «dimensão mais expressiva das ocorrências, a contabilidade estava a ser feita».
Não se bastando na alta precisão aritmética, a façanhuda Adjunta de Operações Nacional da ANPC emprega tal sofisticação na linguagem que, de um tiro, pôs o país de António Costa, que não quer bombeiros a confundir o povo, nos píncaros do progresso comunicacional. Cada ponto da situação — briefing, diria Sá de Miranda — costurado pela doutora Patrícia é um banho de elegância estilística. Por exemplo, e é só um exemplo, atente-se no lavrador de Louriçal do Campo que «ao final da tarde ganhou contornos de maior complexidade» e «onde temos não só combate mas também as defesas perimétricas dos aglomerados populacionais».
Eia! Que vai ser de nós quando os lavradores chegarem à vizinhança das casas?
Confesso, no entanto, um estranho fenómeno psicossensorial, um aflitivo receio recorrente sempre que, duas vezes ao dia, Patrícia Gaspar vem brifar os fogos: a qualquer momento vão irromper detrás dos estandartes, dos logótipos, das siglas e de todo aquele intimidante aparato heráldico o bigode de Pinochet num canto, o bigode de Estaline noutro, o bigode de Kadhafi noutro e o bigode de Maduro noutro. O que, convenhamos, com crianças ou humanos mais sensíveis na sala assumiria proporção suficientemente avassaladora para, sei lá, obrigar o presidente-arlequim a montar-se de novo no falcão.
Patrícia Gaspar, ontem, no justo instante em que um acto terrorista na SIC lhe dava cabo da protecção.
Patrícia Gaspar, ontem, no justo instante em que um acto terrorista na SIC lhe dava cabo da protecção.
________________________________
* Estratégia de marketing, dizem.