domingo, 25 de agosto de 2019

Revista de imprensa ...

... antes de que azede, que nos tempos que correm — et pour cause — ontem já é pré-história.

«Embora não hajam evidências científicas que corroborem a afirmativa, o facto é que os dislates somam e seguem [...] hoje em dia há que ter muito cuidado com o que se escreve.»
Quod erat demonstrandum

Afonso de Melo, cronista prolífico entre os melhores prosadores nos jornais portugueses, na linha de Ferreira Fernandes:
«Kappkadavu é um lugar desinteressante, quanto muito um ponto de passagem para quem demanda Mahé»

«Edward Kennedy, um dos senadores que mais tempo teve na câmara alta norte-americana»
Palavras não eram tidas, perdão, ditas,
«Tive quase para lhe dizer que era piloto»

O quase sempre magnífico Álvaro Domingues, no Público de 04.Ago.2019, volta à "Rotunda dos Trabalhadores do Campo", na EN10 em Samora Correia, onde estivera em 03.Ago.2016 no Correio do Porto, e autoplagia-se. Resta escolher a melhor versão.
Se, caro leitor, acha que exagero no apreço por Álvaro Domingues, experimente estas 34 "Metamorfoses". E não diga que vai daqui. Irrita-me um bocadinho que AD nunca diga onde tira as fotografias, mas não se pode ter tudo.

«'O ócio é o trabalho do poeta', dizia Sophia»
A propósito,
«O ócio é o trabalho do poeta. A frase é de Sophia de Mello Breyner e Nuno Artur Silva concorda em absoluto com ela.»
«A Sophia de Mello Breyner dizia que o ócio é o trabalho do poeta»
Nuno Artur Silva em entrevista ao Expresso/Economia de 24.Fev.2018 [extracto]
Escaldado de citações apócrifas, deixa cá ver se Sophia dizia aquilo.
«O Goethe dizia “O ócio é o trabalho do poeta”. Também é preciso dizer que a maior parte dos escritores têm uma mulher que lhes trata de tudo – da comida, dos filhos, da casa, das compras, das limpezas.»
Sophia de Mello Breyner Andresen, em entrevista à revista Vida Mundial de 31.Mai.1989
Nunca fiando, toca a confirmar se o alemão disse mesmo aquilo, quando e onde. Cá está: no 4.º acto de "O cavaleiro da mão de ferro" ("Goetz von Berlichingen" ), versão definitiva, 1773:
- Ai de mim! Escrever é um ócio trabalhoso, e isso enfurece-me. [Ach! Schreiben ist geschäftiger Müßiggang, es kommt mir sauer an.]
Ou seja, Sophia o que dizia era que Goethe dizia uma coisa que afinal não era bem como Sophia reproduzia; e o doutor Nuno não passa de um citador trambiqueiro relapso *.

Rogério Casanova, fabuloso, diz que viu e ouviu o cantor Toy a dizer:
«nada substitui aquilo que somos enquanto âmago de essência.»
Despertou-se-me logo o auge da culminância.
E não é que o próprio e fabuloso Rogério «caíu na esparrela» d' "Os índices dos níveis da cadência da normalidade"?

«Sendo que entre os cristãos/católicos não praticantes a esmagadora maioria (67% e 64%) se dizem favoráveis a essas duas ditas "fracturas"»
Ciente de como fcancio se excita em público nos seus assuntos — o seu contrato com a MEO, cãezinhos e gatos, José Sócrates, polícias, jovens da Cova da Moura**, Ministério Público, paneleiragem, fufedo e coisas do género, canábis, hagiografia dos sacrossantos defuntos Paulo Cunha e Silva"Manel" Reis, Igreja Católica e o Dom de Dom Manuel Clemente, habitação na baixa lisboeta... —, quero supor com que adjectivo ajaezaria ela maiorias na casa dos 90%, se na casa dos 60% as reputa de esmagadoras. Mastodônticas? Ultragalácticas? Como diria o seu muito apreciado — «Conanzinho, és óptimo, vai por mim» —  e excelso músico, esmaga, Fernanda!

«Hoje, já com um só jogo, a supertaça será entregue amanhã»
«Jaime Martins, residente em Cheira, localidade de Penacova, queixa-se há vários anos do cheiro nauseabundo da Estação de Tratamento de Águas Residuais do concelho»

«A galeria encontra-se instalada na casa Andresen, "onde Sophia passou uma parte muito importante da sua criancice e juventude"»
Infância, doutor Nuno, infância e juventude. Ou meninice, vá.

«A realidade hoje é que se tratam de parceiros de negócios»

Bernardo Mendonça- Continuamos a ouvir frases como "Não sou racista, mas..."?
Francisca van Dunen- A disjuntiva dá sempre asneira.
Asneira, e da grossa, é a doutora Francisca, ministra da Justiça, tratar por disjuntiva uma adversativa.

Eportantodevodizernãotenhoamenordúvidaetc doutora Clara Ferreira Alves:
«Nas tênebras malcheirosas de um restaurante do Soho»
«Depois disto tudo, este senhor, Tomás Correia cujo perfil de ténebras aparece neste excelente texto jornalístico de investigação»
«E portanto, devo dizer — agora perdi-me com esta coisa das ténebras»
Trevas, doutora eportantodevodizernãotenhoamenordúvidaetc Clara Ferreira Alves, trevas***

«Talvez o PS e as outras forças democráticas quando lutaram nos dias lá atrás contra a unidade sindical nunca imaginassem que hoje teriam de lidar com sindicatos que encaram a luta do trabalhador como uma coisa de curto prazo.»

«Assim de repente, estou a ver demasiados entorses à lógica para ficar repousado. »

Faz-me pena António Guerreiro, o melhor, abandonado à sua sorte. Por exemplo, no Ípsilon de 09.Ago.2019. Que andam a fazer os revisores do Público?

«No seu curriculum consta que fundou a Green Project Awards em 2008 e em 2012 foi júri do Festival de Cannes Lion.»

«retrato retrógado»

«uma das razões porque gosto tanto dele»
«Não sei por que contar a verdade às pessoas se tornou utopia»
Porque, porque contar, nabos! Eu, Plúvio gabarola, que não perdi nenhuma e conservo todas as 1275 edições do JL, desde Março de 1981, estou em condições de afirmar que a revisão do jornal está mais desgraçada do que nunca, se é que alguém ainda ali trata disso.
Mas quem mais disparata é João Lisboa na frase: «ao aceitar registar em disco as sonoridades aleatórias, found, ambientais, mais públicas ou mais privadas, porque optaram é tão só o exacto oposto do que Cage não se cansou de explicar» - Expresso/E, 24.Ago.2019
Por que optaram, professor João, sonoridades por que optaram. 

O defunto Alexandre Soares dos Santos talvez fizesse mais sentido nos DESAPARECIMENTOS do que na PUBlicidade. Mas o que me deixa a pensar é o «prevalecente».
Finalmente, uma querela literária. Das boas e picantes, negritos meus:
- «o recluso, de 40 anos, está actualmente detido em prisão preventiva por crimes de roubo e sequestro cometidos já este ano na zona de Santiago do Cacém. Mas há mais de 20 anos que é bem conhecido no sistema prisional. Já cumpriu duas penas por homicídio – foi condenado, em cúmulo jurídico, no início deste século, a mais de 20 anos de cadeia. A advogada, da zona de Lisboa e conhecida também pelas obras literárias já publicadas, foi obrigada a sair daquele espaço», ao ser apanhada dentro da cadeia de Setúbal a foder com o seu cliente.
- «fonte do Estabelecimento Prisional de Setúbal garante ao JN que se trata de uma solicitadora — e não de uma advogada, como noticiou um diário (porque não 'como noticiou o Correio da Manhã'? Obrigações da concorrência.) — contratada para tratar de assuntos familiares do recluso relacionados com uma herança. Além de solicitadora, a mulher também é autora de, pelo menos, um livro de poesia. E o recluso, com reputação de ser "bem-falante", tem alcunha de poeta: "Camões".»
Novo erro de arrumação. Então estas merdas não deveriam estar na secção de Cultura e Artes?
_______________________________________________
* Nuno Artur Silva conversa com Eduardo Lourenço:
Eduardo Lourenço- O grande acontecimento da história de Espanha não foi feito por um espanhol. Foi feito pelo Colombo…
Nuno Artur Silva- O genovês…
EL- … o Colombo que está integrado muito nas aventuras começadas pelo Infante D. Henrique mas na verdade foi um golpe de acaso genial que inventou um novo mundo que criou um novo mundo…
NAS- O herói por acaso, como diz Fernando Pessoa.
EL- … herói por acaso...
Qual Fernando Pessoa qual carapuça, doutor Nuno!
«L'eroe vero è sempre eroe per sbaglio» («O verdadeiro herói é sempre herói por engano») - Umberto Eco, em "Perché ridono in quelle gabbie?" ("Porque riem nessas gaiolas?"), crónica publicada originalmente no jornal "la Reppublica" de 16.Abr.1982, integrada no livro "Sette anni di desiderio" ("Sete anos de desejo"), recolha de intervenções e artigos, de 1977 a 1983, na imprensa italiana. - Bompiani, 1983.

** Os pretinhos bons, os polícias maus e a palavra jovem
Fernanda Câncio [6 peças aqui - ou isto aqui], irmanada com Valentina Marcelino [14 peças aqui], ambas no Diário de Notícias, e Joana Gorjão Henriques no Público [18 peças aqui], a reboque do Bloco de Esquerda/SOS Racismo/Mamadou Ba e com inevitável unção do bonzo de Coimbra [minuto 01:45, eis São Boaventura imprecando São Bento em 12.Fev.2015] lá foram urdindo e fazendo vingar desde 2015, com persistente e manipulada rotulagem etária propícia à comoção das almas sensíveis, a saga dos sempre, sempre, mas sempre tratados por "seis jovens da Cova da Moura"; jamais "indivíduos", "pessoas", "cidadãos", "moradores", ou simplesmente "homens". Para que conste: Flávio, nascido em 1983; Celso, em 1983; Bruno, em 1991; Rui, em 1992; Paulo, em 1995; Miguel, em 1996. Referindo-se a Flávio Almada, senhor de 36 anos, comenta Fernanda Câncio com desvelo pedomaternal: «A brutalidade deste relato de um dos miúdos do caso Cova da Moura é impressionante» - Twitter, 22.Set.2018. Repare-se na candura antropológica [mães, grávidas, crianças a brincar...; de homens ou rapazolas façanhudos, nem uma sombra. Afinal, Cova da Moura é um idílio de inocência, remanso e doçura feminil] das sete ilustrações, escolhidas adrede para enfeitiçar leitores incautos, com que a jornalista Câncio documenta a reportagem de quatro páginas no DN de 15.Jul.2017. Sabidona.
De resto, em nenhuma passagem dos quilómetros de prosa jornalística das três inefáveis plumitivas — Fernanda, Valentina, Joana — me lembro de ter encontrado qualquer alusão ao facto, que dou por adquirido, de o jovem Bruno Lopes, o que desencadeou o caso da esquadra de Alfragide, levar no currículo sete condenações transitadas em julgado de 2008 a 2016 e ter a correr, em Setembro de 2017, 36 inquéritos-crime  [a partir do minuto 23:00]; vendo bem, um anjinho. Também "gostei" da cena, narrada por Joana Gorjão Henriques  no Público de 14.Jul.2017, em que três jovens foram detidos por agentes quando estavam a fazer música num estúdio. «Um dos jovens contou que tinha vindo à porta e depois de um curto diálogo foi agredido com uma bastonada, algemado e atirado para o chão e colocado na carrinha.» Deixem-me imaginar o "curto diálogo":
Jovem- Boa tarde, senhor agente. Como vai a vida? Muito trabalho?
Agente- Faz-se o que se deve e se pode. Uns dias mais tranquilos, outros nem tanto.
Jovem- Ossos do ofício, senhor agente. Temos de enfrentar as coisas com optimismo e calma.
Nisto e sem dúvida por isto, o agente saca do bastão, pumba no jovem, etc., etc.
Escreve Fernanda Câncio no lide da tal reportagem, sem aspas nem atribuição de autoria (Sérgio Godinho): «A sede de uma espera só se estanca na torrente.» Anoto a coincidência de, quando necessita de exibir alguma erudição literária, ser ao mesmo mantra conhecerá outro? que recorre António Costa, secretário-geral do Partido Socialista, primeiro-ministro. Já aqui falei disso.
Sem favor, considero Fernanda Câncio entre os jornalistas que mais bem redigem em Portugal, pese não saber como se escreve retaguarda [ela pensa que é rectaguarda, coisa que nem antes do teratológico AO1990 era]. Mas, depois da extensa e — santa ingenuidade minha! — tardia compreensão do conúbio com José Sócrates numa altura (2001-2011) em que eu apesar de tudo admirava Sócrates e votava no PS, partido que hoje tomo por caldeirão de incestuosa imundície, e acreditava na isenção/desinteresse pessoal do que a jornalista escrevia no DN, não posso deixar de achá-la, também, uma das personagens mais desonestas que conheço e sigo na comunicação social portuguesa. Não lhe perdoo aquilo com que me fez amiúde concordar e vez por outra entusiasmar [e não, não falo de figos]. A esta distância, torna-se-me até desafiante especular acerca da muito presumível influência desta codiciosa e esperta paladina das "causas fracturantes" no ideário e na materialização de políticas por parte da criatura horrenda e mendaz — repartiam o coração sem que isso lhe toldasse a deontologia ao defender-lhe o nome (veja-se, entre múltiplos exemplos, este desavergonhado "J'accuse") e a gabar-lhe dia sim, dia sim, a governação — que certo dia recomendou aos portugueses que não deixassem de ir ver «o filme que se chama Milk, presumo, e fala da biografia de um dos primeiros políticos assumidamente homossexuais».
Câncio, desonesta ... e nem sempre fiável. ****

*** A eportantodevodizernãotenhoamenordúvidaetc doutora Clara Ferreira Alves, cuja intervenção nos órgãos de comunicação social nos últimos 30 anos acompanho e conheço bem, e que tanto admiro na prosa como me encanita no geral, gorjeia invariavelmente disparates como demagògos / acòrdos / pâtético (com o a de acético) / pzeudo / obnóchios / falabilidade / pèrda (a rimar com merda) / èconoclastia / alèrgias (com o e de alertas) / um tòmo (referindo-se a volume impresso) / retrógado / ter morto / vão começar a haver movimentos ...
[demagôgos - acôrdos - pàtético - pçeudo - obnóksios - falibilidade - pêrda - iconoclastia - âlergias - um tômo - retrógrado - ter matado - vai começar a haver movimentos]
Por ser altiva e petulante, arrisca-se a cartas ao director como esta no Expresso de 03.Ago.2019.

**** Fernanda Câncio: «Tenho a mania do rigor. Não me passa.» - Twitter, 16.Dez.2017
«foi criada, em 1996, na sequência do horrível caso da decapitação no posto da GNR de Sacavém, a Inspecção-Geral da Administração Interna, para investigar casos de ilegalidade e de violência nas forças de segurança» - Fernanda Câncio, DN, 22.Jul.2018
Já agora,
Inês Pedrosa: «Houve um caso em 95 de um polícia que decapitou um cidadão numa esquadra, em Sacavém» - "O último apaga a luz", RTP 3, 25.Jan.2019
Há, portanto, que agregar as amiguinhas Fernanda e Inês [CCB, Lisboa, 08.Jun.2010], na contrafacção fervorosa da realidade, à desonestidade insigne de José Saramago e Clara Ferreira Alves.
Já em 31.Mar.2018 Ricardo Araújo Pereira molhara na fantasia o bico desonesto, trocando dessa vez Sacavém por Santarém: «Lembro-me de uma vez, numa esquadra em Santarém... Uma vez, numa esquadra de Santarém, eles serraram a cabeça de um desgraçado.» Lembra-se mesmo?  ***** 

«Comecemos por exemplo, já que falamos da esquerda, com uma frase célebre atribuída a Lenine: 'Proletários de todo o mundo, uni-vos.' Ser proletário, parece, é uma identidade, certo? E uma identidade que deve levar, de acordo com o apelo de Lenine, a que todos os que assim se identificam se unam para, claro, lutar pelos seus direitos.» - Fernanda Câncio, DN, 27.Jul.2019
Azar, doutora. A frase é do Manifesto Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels, e nem é bem assim. «Proletários de todos os países, uni-vos!» Certo? Claro.

***** Sacavém, terça-feira, 07.Mai.1996 - «[...] Carlos Rosa, 25 anos, roubava para alimentar o vício da droga. Acabou apanhado pela GNR e levado ao comandante que lhe encostou o cano da arma à cabeça e lhe berrou mais uma vez ao ouvido para o intimidar. A pistola de José Santos fez fogo no calor do interrogatório e, enquanto Samuel omitiu o crime, Castelo Branco ajudou a esconder o cadáver – embrulhado num cobertor e levado de carro para um descampado na Quinta da Apelação. O sargento Santos usou uma faca de mato para cortar o magro pescoço de Carlos Rosa, até o decapitar. Deixou o cadáver coberto com ramos e levou a cabeça de volta para o posto onde, com uma chave de fendas, tentou tirar a bala comprometedora. Não reparou que a munição atravessou o crânio da vítima e se foi alojar numa porta de madeira. Horas depois, o sargento abandonou a cabeça em Chelas, Lisboa, atirou a faca ao rio Trancão e deitou o cobertor ao Tejo. O esforço foi em vão: a 16 de Maio, dez dias depois, um pastor encontrou o cadáver. [...]».
Insista-se, para desencanto do contrabando noticioso activista: ninguém decapitou um cidadão dentro da esquadra.

Apre!