quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Perder-se dos pais e vice-versa. Dor, cinza.

«Encenador de ópera, Michel Rostain enfrentou, em Outubro de 2003, o mais inconcebível dos sofrimentos: a morte do filho único, Lion. Aos 21 anos, o jovem sucumbiu em poucas horas a uma meningite fulminante. O filhoé o relato detalhado de como um casal atravessou o caos da dor e o longo processo do luto, encontrando no fim do caminho motivos para dar sentido à vida e para gritar, como o pai em lágrimas à saída da morgue, “Viva o sol! Viva o sol, apesar de tudo!” […] O narrador não é o pai destroçado; é antes o filho, o morto [as cinzas foram enterradas no flanco do Eyjafjallajökull] uma espécie de fantasma que o texto inventa e reclama.

[…]

Em certos dias, os meus pais inspiram fundo as minúsculas partículas de cinza  que descem do Grande Norte até ao sul da Europa, como se elas viessem de propósito carregadas de mim.*»

José Mário Silva, “Sobreviver ao luto| Expresso/Atual, 11.Jan.2014

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* Dizem que pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiose é uma palavra fictícia. Nunca fiando, recomenda-se moderação nas inalações. Há tosses que matam.

PS - Sorrir no vulcão da dor é sabedoria rara a que não raro aspiro. Ignorante e frágil, o mais que consigo é quase sempre chorar. E tossir.