«pediu ao motorista para parar o carro junto a um dos penhascos. De seguida, saiu e atirou-se ao mar.»
Uma semana depois, raiando o admirável como quase sempre, Gonçalo M. Tavares escreve:
«[...]
O embaixador aproxima-se do precipício, e este chama-o com a voz que a tristeza ouve; a voz que só uma certa tristeza limite consegue ouvir.
[...]
Que sabemos dos humanos?
Sabemos pouco.»
No mesmo dia da publicação de Gonçalo M. Tavares dizem-nos que
«[Oliver Antić, 1950-2022*] era um apaixonado pela fotografia e estava a fazer um vídeo ... para enviar aos netos, que vivem nos Estados Unidos, quando escorregou numa rocha e caiu ao mar. ... Estava a filmar de costas para o mar.»
Azares destes, e quero crer que Gonçalo M. Tavares foi tão induzido no engano como eu, sucedem aos melhores. Sobretudo quando não se controlam todas as fases da cadeia de produção...
Posto o que, Gonçalo M. Tavares talvez devesse tentar uma conversa com o motorista antes do próximo episódio de "Os cadernos e os dias - História fragmentada do mundo".
Quando olhas longamente para um abismo, também o abismo olha para dentro de ti.
- Friedrich Nietzsche, no capítulo IV de "Para além do bem e do mal", 1886, que li aos 19 anos.
Ainda hoje não olho de cima para baixo a mais de 10 metros de altura que não me lembre disso.**
Aos 68 apetece pensar que tenho resistido com castidade heróica à sedução do precipício.
Sim, Gonçalo, sabemos pouco dos humanos. Quase nada. Se calhar, nada.
_____________________________** - Mas, ó Plúvio, isso não é a VPPB? E se te deixasses de enredos literários da treta?...