sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Crítica

«A crítica, especialmente a crítica literária dos jornais e revistas, está moribunda.
[…]
há os melancólicos, os canonizadores, os avaliadores, os mediadores, os animadores do gosto, os caçadores de tendências e os que são tudo isto ou várias coisas ao mesmo tempo porque tal é preciso num meio em que a procura é escassa e a autonomia reduzida.
[…]
aqueles a quem se devia dirigir em primeiro lugar a crítica, aqueles que, em última instância, detêm o poder de legitimá-la e de prolongar o diálogo que ela deveria estabelecer, foram excluídos ou excluíram-se voluntariamente porque o discurso deixou de lhes dizer respeito.
[…]
Prescindir do juízo dos pares, dispensar a sua função legitimadora, colocá-los à distância, não procurar a autorização conferida pelas regras do campo específico da disciplina ou da actividade intelectual que se exerce — tudo isso resulta num obscurantismo disfarçado de entretenimento. Nestas condições, a tagarelice não será interrompida porque quem estaria em condições de a denunciar já se demitiu até de entrar nos lugares onde ela reina e se por acaso ou imprudência se cruza com ela limita-se a virar a cabeça para o lado. Não tenhamos ilusões: o crítico pode hoje ser inócuo e medíocre impunemente porque se ausentaram os que o podiam criticar.»
António Guerreiro, “O crítico póstumo
- x -

A propósito, que diz a crítica de A confiança no mundo – Sobre a tortura em democracia, de José Sócrates?
«[…]
Mais raro é o facto de governantes portugueses em idêntica situação procurarem adquirir conhecimentos ou aprofundar leituras e optarem pelo estudo da teoria política enquanto ganham distância em relação à arena onde se embrenharam durante anos a fio e à qual muitas vezes pretendem  regressar. Nem que seja por ter tomado esta opção — exemplar, sobretudo para uma classe política pouco preocupada com questões teóricas e intelectuais — o livro de José Sócrates merece ser lido por críticos e académicos interessados nessas mesmas questões.
[…]
Quanto a Kant, estranha-se apenas que o autor tenha afirmado que lera mais de dez vezes a A Metafísica dos Costumes e esta obra não surja sequer citada na bibliografia final (não confundir com A Fundamentação da Metafísica dos Costumes, também de Kant, como o autor fez notar numa inflamada, extensa e desproporcionada resposta a uma crónica do Comendador Marques de Correia/Henrique Monteiro, publicada no Expresso).
[…]
estamos em presença de um trabalho de mestrado, nem mais nem menos do que isso. Um trabalho competente para os fins circunscritos a que se destinava, e que o aluno logrou alcançar com êxito. Este livro não deve ser avaliado, positiva ou negativamente, em função da personalidade e da carreira públicas do seu autor. Pelo contrário, a apreciação deve cingir-se ao estrito propósito universitário que esteve na génese deste livro.
[…]»
Diogo Ramada Curto