domingo, 25 de outubro de 2015

Beirões e autoridade moral

«É por isso que estamos aqui hoje a honrar o ADN de todos os beirões.»

José Sócrates pegou na palavra e, mal pôde, pôs-se a honrar um, comparando-se-lhe com o mais repulsivo e descarado oportunismo que a desvergonha alcança [A partir do minuto 30:20]
«E quero neste ponto relembrar, ou melhor, evocar aquilo que tem sido muito discutido recentemente. Têm certamente reparado numa campanha pública em Portugal que me é muito simpática, à qual adiro imediatamente. Trata-se da campanha para defender um cidadão luso-angolano que está preso há quatro meses em Angola com acusação e à espera de julgamento [palmas da sala]. Como digo, essa causa é-me muito simpática porque há um princípio também nos estados de direito democrático: é que os cidadãos devem esperar em liberdade o seu julgamento. E a prisão preventiva deve ser a todos os títulos excepcional porque põe em causa desde logo a presunção da inocência. Mas passando por cima disso, o que tenho anotado – não sei se têm reparado – é que as autoridades angolanas parece que respondem a esta campanha da mesma forma que as autoridades portuguesas, parece que dizem "à justiça o que é da justiça, à política o que é da política" [risos e palmas da sala]. Eu quero dizer um pouco mais porque quero afirmar também que não é apenas esperar em liberdade pelo seu julgamento. O que está em causa nesse cidadão luso-angolano não é apenas esperar em liberdade o seu julgamento. O que está em causa é uma outra coisa. O que está em causa é que a conduta pela qual ele é acusado nunca devia ser criminalmente punida [palmas da sala].
[…]
Pude observar que algumas pessoas falaram destes assuntos com desassombro e com coragem, nomeadamente o eurodeputado Marinho e Pinto, nomeadamente o antigo deputado Francisco Louçã que se referiu à prisão como forma de investigar. E alguns, na política. Esses, sim, têm autoridade moral para fazer esta campanha a favor do nosso compatriota luso-angolano que está preso em Angola. Esses, sim, tinham autoridade para falar do nosso compatriota que estava preso preventivamente há cinco meses, sem acusação, em Timor-Leste. Lamento, mas os outros falta-lhes uma certa autoridade moral porque não se pode julgar a mesma situação com critérios diferentes [palmas da sala].»

Mais disse o ex-primeiro ministro [votei nele em 2005 e em 2009 por achá-lo o indivíduo com mais pinta para governar Portugal], indiciado judicialmente de corrupção, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais, eram 18:11, na palestra em que pronunciou 1946 vezes «quero» e, como é seu hábito, citou 322 filósofos sem identificar nenhum:
«Eu quero instituições que ajam em nome do Estado e que nós possamos respeitar e esse respeito vem da obrigação e do respeito pela lei, da decência nos procedimentos e do escrupuloso cumprimento dos formalismos, porque a democracia é também o reino dos formalismos, o reino dos procedimentos decentes, o reino do respeito pela lei.»**
Escrúpulo escrupuloso e decente decência, nos procedimentos procedimentais e nos formalismos formais. Pois. 

Comentário do dia:
- Esta manhã, no Expresso em linha.
Aparentemente, uma fava já foi paga. E bem.
__________________________________________
* O tema anunciado era "Justiça e Política". Verifiquei: o tema foi outro. 
** Esta passagem não consta da gravação, de 53 minutos, disponibilizada no YouTube pelo Movimento Cívico "José Sócrates, sempre". José Sócrates falou durante 63 minutos, entre as 17:22 e as 18:25 de 24.Out.2015.