domingo, 23 de março de 2014

Sobernal

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Em média, o tempo de trabalho é hoje superior ao que vigorava no século XIX. Todas as utopias que prometiam uma sociedade do lazer e viam no progresso tecnológico um meio que nos libertaria do trabalho foram desmentidas. Pior do que isso: a evolução e a multiplicação dos utensílios, em vez de serem factores de libertação, dilataram o tempo de trabalho e elevaram à máxima potência a lógica económica que se realiza na corrida pelo aumento da produção e do lucro. Evidentemente, isso só foi possível pondo em prática métodos de gestão que submetem, controlam, pressionam e induzem a uma competição que quebra solidariedades e cria delatores. Veja-se, aliás, como o apelo governamental à delação — algo que outrora seria considerado abjecto — começa a generalizar-se. O burn-out consiste em ultrapassar o limiar da resistência a uma adaptação violenta, coerciva, que, no limite, exige dos empregados que eles sejam “empreendedores” e, até, que os artistas se inclinem perante os códigos e as prerrogativas das indústrias culturais. Adaptação e flexibilidade são os nomes da actual ideologia do trabalho e da produção.
[...] a regra em que vivemos: os hospitais estão cheios de médicos doentes; as escolas estão cheias de professores que temem mais as aulas e a avaliação a que estão submetidos do que os alunos que ensinam e avaliam; os guardas das prisões estão tão encarcerados como os detidos que vigiam. Não há exterior ao tempo de trabalho. E, imersos em tudo isto, aqueles que dizem combater o capitalismo, ou pelo menos as suas lógicas mais nefastas, não fazem senão exaltar o trabalho e fixar as formas de vida que ele implica.
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