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Há outro extraordinário romance de Tevis, publicado originalmente em 1983, que apesar de anos de ameaças e falsas partidas nunca foi adaptado ao cinema. (Bertolucci chegou a estar envolvivo, e, segundo consta, a última pessoa a adquirir os direitos terá sido Heath Ledger, que planeava a sua estreia como realizador). Queen"s Gambit - como o Murphy, de Beckett ou The Luzhin Defense, de Nabokov - inscreve-se numa reduzida mas honrosa linhagem de ficções "sobre" xadrez. Ao contrário delas, no entanto, a sua intenção não é usar o tabuleiro como ponto de partida para experiências formais, mas sim instrumentalizar as energias próprias da pulp fiction para tratar o jogo como um desporto. Tanto quanto sei, Queen"s Gambit é o único romance com descaramento suficiente para tentar, e conseguir, extrair tensão dramática da descrição de uma partida de xadrez.
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O efeito de alienação produzido por uma inteligência agressivamente fora da escala não é um tema ficcional fácil, por motivos óbvios: é praticamente impossível um autor representar com plausibilidade, na página ou no ecrã, capacidades intelectuais superiores às suas, e dramatizar as desvantagens da mesma sem resvalar para a condescendência. Os esforços de J. D. Salinger para fazer algo semelhante com a família Glass produziram pouco mais do que uma colecção de fedelhos mimados.
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