«Na fastidiosa discussão sobre a venda em leilão dos quadros de
Miró, omitiu-se geralmente esta pergunta incómoda, mas indispensável
para percebermos o que está em jogo: porque é que aqueles banqueiros do BPN,
cúpidos e filisteus de nome próprio — até muito para além do que a lei permite —
adquiriram um acervo artístico que agora muitos querem preservar em território
nacional, concedendo-lhe uma sublimidade que não aceitam ver trocada por um
valor redutível a capital real? A resposta é óbvia e toda a gente a conhece.
Porque os banqueiros, na medida em que sabem muito de dinheiro, têm também da
arte este saber importante e necessário: as obras de arte circulam como o dinheiro.
E se a arte se comporta como o dinheiro é porque o dinheiro se comporta como a
arte.
[…]
Nada
exprime melhor a natureza mercantil do nosso mundo do que a arte.
[…]
A um Governo como o que temos não queiram os cidadãos ministrar
educação artística: é uma tarefa impossível, ociosa, cujo resultado trará
sempre pouca arte e muita ideologia. O que é imperdoável é que quem sabe tão
bem que arte é dinheiro pareça não estar à altura da regra de que dinheiro é
arte.»