«Somos constantemente
solicitados a contribuir para a audit society em que vivemos: fazemos uma operação
bancária mais complexa, recorrendo aos ofícios de um “gestor de conta”, e ao
fim de alguns dias recebemos um telefonema a pedir para avaliarmos o banco e os
seus funcionários, segundo parâmetros de satisfação que vão de um a dez; pomos
o carro na oficina, para uma revisão, e mal o retiramos somos contactados por
um profissional de relações públicas que nos pede para fazermos uma avaliação
dos serviços prestados, incluindo a solicitude com que fomos atendidos, usando
mais uma vez a canónica tabela de um a dez; usamos os serviços técnicos da
companhia que nos fornece telefone, Internet e tutti
quanti (companhias especializadas em vender-nos o que
não queremos comprar), e haveremos de ser convidados, por telefone, a fazer a
avaliação quantitativa do “desempenho” dos anjos cibernéticos que são
verdadeiros ministros de um poder executivo oculto. Sempre que respondemos a
estes inquéritos, estamos a participar num sistema de controlo exercido em
cadeia: cada um controla o próximo, através dos métodos policiais da avaliação,
e é estimulado a exercer formas de auto-controlo e auto-avaliação.
[...]
Hoje,
a verdadeira arte política dos governos democráticos, do poder
cibernético-governamental, é a estatística. Daí, a orgia de números no discurso
público que somos obrigados a atravessar, todos os dias, em todo o lado. Os
centros de decisão do poder político são centros de cálculo e de tradução
estatística. E o nosso horizonte está preenchido pela aritmética política, por
um governo planetário dos números. A avaliação, ferramenta primeira da actual
técnica gestionária, pode ser definida como um poder regulador e uma polícia
científica.
[...]»