terça-feira, 5 de maio de 2015

Mário Soares engana os leitores e patina confrangedoramente no ridículo

Que pena, doutor Mário Soares, que pena!

«[…] Na passada sexta-feira, em Aguiar da Beira, Passos Coelho estava a comer queijos - era o Dia do Trabalhador, note-se - e encontrou o seu amigo Dias Loureiro, que foi em tempos ministro da Administração Interna e que ganhou muito dinheiro, como, aliás, o actual Presidente da República, sem se saber bem como nem porquê. Foi um encontro entre amigos solidários, não só pelo interesse dos queijos, ao que dizem muito agradável. O elogio que Passos Coelho fez a Dias Loureiro, como empresário-modelo, é verdadeiramente indigno. […]»


Quanto ao "elogio indigno", morro de curiosidade por saber o que acha Mário Soares do elogio comovido que o biltre Loureiro, agora elogiado, fez em 30.Jun.2008 ao seu (de ambos, MS e DL) amigo José Sócrates, sendo este primeiro-ministro e o outro andando já a ganhar muito dinheiro sem se saber bem como nem porquê.

«[…] Felizmente que há duas grandes figuras moderadas e extremamente inteligentes, que têm uma visão do futuro que marca os seus e outros Estados. Refiro-me, como os meus leitores já perceberam, ao presidente norte-americano Barack Obama e ao Papa Francisco.
Barack Obama, a dois anos do fim do seu mandato e com a oposição permanente dos reacionários republicanos, tem vindo a desempenhar um papel extraordinário tendo em vista o restabelecimento de relações com Cuba, abrindo as portas aos dois Estados e oferecendo ao seu interlocutor uma excepcional oportunidade que está em marcha.
Quanto ao Papa Francisco, todos os dias nos fala invocando as dificuldades das boas causas e promovendo o diálogo e o entendimento entre as pessoas e as diferentes religiões.
A verdade, contudo, é que além das excelentes personalidades referidas e o papel que desempenham há, por outro lado, os responsáveis pelos mercados usurários que tão mal têm feito à humanidade, explorando desenfreadamente os recursos naturais, nomeadamente o petróleo.
É necessário e urgente que os geólogos e outros cientistas intervenham, impondo-se também o apoio dos políticos e dos governantes que queiram defender a Terra contra os mercados usurários.
É preciso combater os efeitos decorrentes das acções agressivas contra a natureza que favorecem fenómenos como o que ocorreu no Nepal, onde morreram até hoje cerca de sete mil pessoas, afectando mais de oito milhões de pessoas. […]»

O psitacismo com que, mais copiosamente desde Outubro passado, crónica a crónica, Mário Soares preenche todas as terças-feiras a página 8 do Diário de Notícias, começa a meter dó. Isto cheira-me a que sejam os três padres que jantam lá em casa [Vítor Melícias, Bento Domingues, Januário Ferreira] a ditar cada um seu parágrafo entre tragos dos capitosos néctares do Douro, Dão, Bairrada e Alentejo…
Mas sejamos justos. Se o DN oferece todas as segundas-feiras meia página à eloquência patareca do inenarrável Fernando Seara, nesse caso o "pai da democracia portuguesa" mereceria, mesmo levemente senil, um destacável inteiro todos os dias. É o mínimo a que faz jus o bom gosto dos 30 mil quinhentos e sessenta e cinco leitores do DN.

Tenho de dizer.
Nunca simpatizei com Mário Soares, mas votei sempre nele*.
O mesmo com José Sócrates. Não tenho, desde sempre, um pingo de simpatia pela sua pessoa, mas não só votei invariavelmente nele* como pugnei até ao fim, no meu convívio e neste estaminé, pela sua governação. Achava-o, desde que me lembro — e levo 45 anos de activa lembrança política  —, o primeiro-ministro de maior estaleca.
Hoje em dia, porém, mais do que uma pessoa desagradável acho-o uma personalidade monstruosa. E não, a maior nitidez do meu retrato do monstro não vem, por enquanto, da tecnicidade jurídica dos crimes de "corrupção" — longe e muito difícil de evidenciação —, "branqueamento de capitais" ou "fraude fiscal"; lá se chegará, ou não. O monstro que agora vejo em José Sócrates é espírito, é ectoplasma, é mau duende. Mora no que diz, como diz, no que tem escrito; está no lume alucinante com que sabe e parece conseguir enfeitiçar e abrasar os seus amigos, seguidores e apaniguados. **
Sim, acho José Sócrates um fabuloso artista, aldrabão, embora não desconheça que a mentira é uma banalidade, um, por assim dizer, elemento estribante de sobrevivência e civilização. Prezo incomparavelmente mais a honestidade.
Quem sabe, enfim, estes meus dois amigos tenham de facto visto e percebido o verdadeiro José Sócrates muito antes de mim. Oxalá estivesse eu agora enganado.
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* Anarca de inspiração e formação, reconheço-me sem esforço, céptica e cinicamente, um eleitor esquizofrénico.
** Esta extensa conversa de há ano e meio continua a dizer muito, e a não dizer, de José Sócrates.